sábado, 6 de janeiro de 2007

Incoerência ou estratégia oculta?

Por vezes, perante as crescentes e continuadas dificuldades que nos obrigam a apertar o cinto para reduzir a capacidade do estômago e as necessidades de alimentos, somos tentados a pensar que os governantes carecem de inteligência e competência para o desempenho dos seus cargos. Mas essas tentações de desconfiança são injustificadas. Eles são pessoas de elevado grau de inteligência e são lutadores que, numa acesa competição pelo nosso voto, conseguiram ganhar jus a ocuparem as cadeiras do Poder. A aparente confusão entre promessas não cumpridas, realizações anunciadas e nem sempre concretizadas e as necessidades reais do País, é geralmente bem gerida com a ajuda dos órgãos da comunicação social, de forma a não arriscar os resultados das eleições seguintes. As nossas impressões poderão ser apenas resultado e informação deficiente, de desconhecimento das estratégias elaboradas no segredo dos gabinetes, com muita perspicácia com vista a serem atingidos os objectivos por eles desejados e que o povo desconhece.

Vejamos, por exemplo, três casos que os jornais têm trazido ao nosso conhecimento, relacionados com a falta de eficiência da Justiça e com a aparente fuga ao combate à corrupção e ao enriquecimento ilícito.

1. A juíza Maria José Morgado, uma estrela brilhante no meio de planetas sem luz própria, tinha evidenciado muita sensibilidade para o combate à corrupção e ás tramóias do apito dourado. Embora neste processo tudo se passe, no âmbito do futebol, um sector restrito e bem delimitado da sociedade, e a corrupção, pelo contrário, venha ao longo do tempo a afectar a generalidade dos dinheiros públicos e os políticos desde as autarquias até aos governos e à AR, ela foi encarregada do problema menos grave, por aparentemente não haver interesse político para atacar o outro.

2. O engenheiro João Cravinho, desde que foi ministro das Obras Públicas e Comunicações, tem evidenciado interesse em acabar com a corrupção, tendo até nomeado o general Garcia dos Santos, seu colega do IST, para a Junta Autónoma das Estradas com a incumbência de sanear esta instituição. Mas, provavelmente, as pressões a que foi sujeito levaram-no a afastar o general e a ignorar os suspeitos. Agora, como deputado, reavivou a sua pura aversão à corrupção e ao enriquecimento ilícito, mas, possivelmente, os numerosos «suspeitos« não pararam enquanto não conseguiram afastá-lo e a melhor forma foi dar-lhe «um pontapé pela escada acima» e enviá-lo para um invejável cargo no estrangeiro. Desta forma, por melhores que sejam as intenções de Cravinho, a sua luta acaba por estiolar sem produzir os desejados frutos em benefício do País.

3. Embora o sobrevoo do território nacional por aviões da CIA pertença já ao passado e, perante os interesses de desenvolvimento do País e da melhoria das condições de vida da população, não se revista de importância capital, o partido do Governo está a pressionar a embaixadora Ana Gomes a apresentar queixa no Ministério Público. E assim se iria entupir ainda mais os canais da Justiça, já tão lenta e desacreditada perante o povo, quanto aos seus resultados. Desta forma se evita o combate proposto por João Cravinho e já referido por Maria José Morgado.

Fica uma dúvida: estes casos serão sintomas de incoerências e contradições dos governantes ou serão a ponta do iceberg de uma estratégia inteligentemente elaborada, com vista a objectivos bem definidos? O certo é que não devemos duvidar das capacidades dos políticos, em inteligência e engenhosidade.

8 comentários:

Gisele Claudya disse...

Meu amigo João,
Sei que problemas assim há em todo país mas, diante dos problemas que nós, brasileiros, vivemos, os problemas de vcs são bem menores ( mas, nem por isso, menos importantes, claro).
Eu acho que, por mais que a gente tente mudar tudo isso, não creio que seja a nossa geração que verá resultado satisfatório. Eu perdi a esperança, infelizmente. Não totalmente mas já sinto-me sem forças.Deus permita que nossos países consigam melhorar. Afinal, votamos pra isso, né?
Beijinhos,
Gisele

Anónimo disse...

Muito bem visto, sim senhor, meu amigo.

E eu ainda digo mais: a maior parte dos nossos governantes são até sobredotados tendo canalizado a sua "sobreinteligência" para conseguir levar o povo a votar neles.

Nesta perspectiva, só é pena que não tenham canalizado tamanha inteligência para arranjar soluções para melhorar o país e a vida dos portugueses.

Afinal nós não temos "burros" a governar, temos é "sobreinteligentes" que resolveram por um tempo canalizar a sua inteligência para conseguir chegar ao poleiro...

Por isso, queridos amigos, não estejamos tristes porque com tanta inteligência "decerto" o próximo passo será cumprirem o que prometeram enquanto tentavam chegar à posição que têm agora.

É uma questão de tempo...

Mas permitam-me a ousadia de vos dizer que BURROS somos nós que ainda vamos em cantigas!

Alexandra Caracol

Anónimo disse...

Caro João Soares,uma análise realista.

O meu amigo sabe que eu vinha constantemente no JN em opinião do Leitor,mas desde a arranjada entrevista que menciono no texto em baixo deste célebre político investigado e depois do envio do referido texto para aquele jornal,calaram-me...Ainda bem,pois vou denunciar mais coisas!!

Aqui vai com um abraço:
de Mesquita Machado,uma reportagem no JN, sequencial de outra que foi feita à tempos no JN a outro autarca local,João Nogueira.Não vislumbrei nada de novo.Até aqui nenhum presidente da câmara nasceu em Braga.Há trinta anos era um jovem robusto com sangue na guelra e hoje "com menos pujança física mas mais bom senso e ponderação".O bom senso ou senso comum é uma velha artimanha que mais não passa de uma subjectividade.Cada um entende o bom senso como seu.Para lá disso, fica o registo de uma vontade da sua reeleição no próximo acto eleitoral em Braga,dependente da sua condição psíquica.Aqui discordo, acho que só poderá ser reeleito se os eleitores nele votarem de novo.Não o acho minimamente provável.
Não tenho nada de pessoal ou partidário contra o senhor presidente, mas acho que as comparações que faz no passado, podem ser feitas hoje se compararmos Braga com outras cidades europeias.Principalmente no caos urbanístico,nas grandes superfícies que florescem no meio da cidade em locais habitacionais.O desregulamento total do trânsito no centro da cidade.O problema da corrupção que o presidente admitiu poder existir, em resposta a Mário Soares,quando este falou na crescente corrupção nas autarquias.Facto que se investiga na Policia Municipal de Braga e na Secção de Fiscalização da CMB,no mesmo edifício.Convém dizer que esta polícia depende em exclusivo do presidente da câmara,com vereadores ou não pelo meio.A eco-limpeza é mais fraca agora, depois da Agere ter caminhado para a privatização.Limpam mal,os cestos para colocação do lixo,onde os há, estão abertos (o fundo não fecha). Os prédios deixam cair as fachadas e não são fiscalizados.A Policia Municipal comprou reboques para fiscalizar o trânsito descurando todas as fiscalizações de que dependem as portarias municipais. Cresceu em Braga o estádio de futebol mais dispendioso que Portugal infelizmente construiu para o Euro 2004. Incómodo,mau em todos os aspectos para o espectador ou até para o espectáculo do futebol.Ficámos com o 1º de Maio ali plantado á espera de um futuro, para lá de custar mensalmente muito dinheiro também.Por sinal um estádio muito mais bonito,cómodo e de acesso do público ao cimo das bancadas de excepcional qualidade,envolvente.Diz-se que só o Municipal custa em juros mais de 10% do orçamento camarário, mensalmente.Por quantos anos?O comércio tradicional asfixia com tantas grandes superfícies em Braga.Vem agora o tempo em que as próprias grandes superficies se afundarão,pois isto não pode dar para todos.Abrirá ao público em breve o Retail Center de Braga (tão polémico) e para breve a construção do Dolce Vita lá para os lados do estádio Municipal.Entre o Feira Nova e a Rua Nova de Santa Cruz, no meio da confusão instalada na Rua Quinta da Armada com os camiões que vão abastecer o referido hiper, cresce um centro comercial sem nexo,nos terrenos antigos da fábrica Confiança....falta de espaços ajardinados nos prédios encavalitados uns nos outros.Fica a consolação do crescimento da UM (Universidade do Minho).
Enfim muito havia a dizer,mas o espaço do jornal não é como a autarquia que pode pedir empréstimos.
Curiosamente não fala nessa peça no JN do seu envolvimento de sempre com o futebol...
Caro senhor presidente Mesquita Machado desejo-lhe um resto de mandato com saúde,mais atento,olhando para a população que o elegeu.O senhor é o presidente de todos os bracarenses,mesmo daqueles que nunca tenham votado em si,mas que ainda gostavam de acreditar em si.

Mário Relvas in http://aromasdeportugal.blogspot.com

A. João Soares disse...

An«miga Gisele,
Obrigado pela visita. É certo que cada um nada de concreto consegue. Mas a solução terá de vir dos cidadãos, e é necessário alertar toda a gente da modorra em que tem vivido. A denúnca da situação e Braga pelo Amigo M Relvas é um exemplo daquilo que cada um pode fazer. A opinião dos cidadãos, em democracia tem muito valor, mesmo que não tenha resultdos imediatos.
Cara Alexandra, é verdade que eles são «superinteligentes» tanto que como diz João Cravinho existe enriquecimento ilícito, real mas ilícito. E é preciso que o bom povo não seja qualifiacdo como BURRO ou PACÒVIO perante a autodenominada «classe» política (Nova versão da luta de classes). Um cronista do Jornal de Arganil divide a sociedade portuguesa em «parlapatões» e «pacóvios», colocando no primeiro grupo os políticos, a «classe» política.
Este é um tema que merece ser aprofundado e alargado no seu âmbito. Destes comentários parece que há maior pendência para a se tratar de um «estratégia oculta» e não para uma «incoerência» ocasional.
Cumprimentos
João

Anónimo disse...

Essa do Eng. João Cravinho andar armado em cavaleiro andante contra a corrupção é uma autêntica anedota. Porque, se fizesse o trabalho com rigor, meter-se-ia na cadeia a si próprio!

A. João Soares disse...

Em questões de tráfico de influências, vulgo corrupção, há dois intervenientes, ambos beneficiados com o «negócio», aquele que recebe o favor e aquele que o faz e recebe a respectiva recompensa. Este tem de ser uma pessoa com Poder. Logo os poderosos, nas autarquias e instituição públicas, são os mais implcados. Daquilo que consta nos comentários, poderá concluir-se que o sesforço para os governantes evitarem a luta contra este tráfico não será «incoerência» mas sim uma estratégia oculta a que se podem aplicar os seguintes vocábulos: aparência, arremedo, artifício, disfarce, dissimulação, drible, farsa, ficção, fingimento, finta, hipocrisia, simulação, simulacro. É só escolher qual destas se aplica melhor à anunciada luta prometida por Cravinho e pelos governantes.
E assim vai este País...
João

Anónimo disse...

Claro que os políticos “são pessoas de elevado grau de inteligência e são lutadores que, numa acesa competição pelo nosso voto, conseguiram ganhar jus a ocuparem as cadeiras do Poder.”

É por isso mesmo que os resultados dos seus governos nos deixam sem qualquer dúvida sobre as suas canalhices, actos de malvadez e traição. Mais, a sua malvadez é directamente proporcional à sua inteligência e capacidade de fazer mal. O único caminho para o estado a que o país chegou, vistas as circunstâncias explicadas neste post é a traição. Mas a culpa não é só deles, é também dos jornaleiros indecentes e indignos que os encobrem. Também não se pode esquecer de que grande parte dessa culpa é daqueles que lhes permitem a continuidade de tal procedimento. Enquanto alguém votar neles eles têm sempre razão para continuarem no mesmo caminho.

O “bom povo” é BURRO e PACÓVIO. É “uma estratégia oculta”. Há que reconhecer todas estas coisas. Se não, como se poderá corrigi-las?

Anónimo disse...

Amigo A. João Soares,

Passei por aqui para lê-lo com a maior atenção, como sempre faço. Fiquei deliciado com o texto. É uma análise perfeita. Tão perfeita que tomei a liberdade de inseri-la no Passa-Palavra usando a prévia autorização que me concedeu e que uma vez mais agradeço.

Um abraço e continue a deliciar-nos com os seus textos, se faz o favor...