sábado, 30 de junho de 2007

Directora demitida (continuação)

O assunto do post recente intitulado Directora demitida... por pecado mortal está a dar origem a críticas generalizadas, mesmo dentro do partido do Governo, onde também há pessoas de bem, apesar do que algumas más línguas insinuam. Mas o que preocupa continua a ser a falta de um timoneiro na equipa governativa com coragem para substituir os autores de tantas acções menos responsáveis e dignas que sujam a imagem positiva que algumas intenções reformadoras deviam criar ao Governo.

Para ajudar a esclarecer o tema, transcrevem-se dois artigos de jornais diários:

Despacho de Correia de Campos caiu mal no PS

Susete Francisco

Socialistas preocupados com efeitos deste caso
A exoneração da directora do Centro de Saúde de Vieira do Minho, por causa de um cartaz que gozava com declarações do ministro da Saúde, caiu mal entre muitos socialistas. Para quem Correia de Campos usou de "excesso de força", num caso que poderia ter sido resolvido de outra maneira.

Depois de Manuel Alegre ter vindo qualificar como "intolerante" o despacho que demitiu Maria Celeste Cardoso do cargo, também o deputado socialista Vítor Ramalho disse ontem ao DN não compreender a reacção do ministério a este caso. "Os contornos do despacho são para mim incompreensíveis. Não os percebo, não percebo a razão", sustentou o também líder da distrital socialista de Setúbal. "Digo isto em defesa do PS e dos valores do PS, fundado como um partido que preza a liberdade de expressão", acrescentou Vítor Ramalho, sublinhando que numa "situação normal" - entenda-se "num quadro de direito à liberdade de expressão" - uma "situação destas não deve ocorrer".

Para o deputado da maioria "os serviços públicos não devem ser palco para comentários jocosos" - mas o que "seria razoável, se o ministro soubesse que havia um cartaz nesses termos, era pedir para o retirar". E não avançar para uma medida que "pode pôr em causa a imagem do ministro e do Governo". "Não vejo razão para isto", conclui o deputado.

As reservas de Vítor Ramalho estão longe de ser isoladas no interior do partido. "Isto não é o PS", afirmou ao DN outro socialista, questionando o argumento de quebra de lealdade invocado por Correia de Campos para justificar a exoneração da directora do Centro de Saúde (ver texto na página ao lado). "O dever de lealdade funcional é algo diferente de uma anedota", acrescenta. Para deixar uma pergunta: "Quantas vezes não se dirão anedotas, em escolas, em locais públicos, sobre o Governo ou sobre ministros. Vai-se fazer o quê? Andar atrás de toda a gente?". O mesmo socialista adverte ainda que o partido está a dar trunfos ao adversário: "Numa situação em que se pede compreensão aos portugueses, estamos a dar o flanco em matérias de mercearia". E esta é uma reserva que se estende mesmo a outros nomes do PS que se revelam mais concordantes com a decisão de Correia de Campos. Ou seja, mesmo nestes casos os socialistas não deixam de manifestar preocupação com os efeitos de mais este caso junto da opinião pública, depois do episódio com Fernando Charrua (ver caixa em baixo). E há mesmo quem assegure que o assunto não deixará de ser levado à reunião do grupo parlamentar e aos órgãos próprios do partido.

Oposição quer ministro na AR

Marques Mendes, líder do PSD, já veio apontar este caso como um exemplo da intimidação que, afirma, grassa no País. Para Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP, "é mais um sinal, mais um tique no quadro de acontecimentos preocupantes". "Oxalá sejam só tiques e apenas sinais, mas que são inquietantes são", sustentou o líder comunista. BE e PCP pediram já a audição do ministro Correia de Campos no Parlamento.

Membro da JS denunciou cartaz polémico ao Partido Socialista

Ivete Carneiro

Celeste Cardoso insiste que não havia qualquer motivo para instaurar um processo ao médico depois do cartaz ter sido retirado

A sombra da delação e da perseguição política paira sobre o caso da exoneração da directora do Centro de Saúde de Vieira do Minho, apesar de todas as negações oficiais. Antes de se fechar em "blackout" informativo, o líder da concelhia local do PS admitiu ter sido um membro da Juventude Socialista de Vieira do Minho o "cidadão" que pediu o Livro Amarelo do estabelecimento para se queixar do cartaz da polémica. Um cartaz que reproduzia uma entrevista do ministro da Saúde, publicada no JN a 6 de Agosto de 2006, dizendo que nunca iria a um serviço de atendimento permanente (SAP).

Relatado ao PS local, o caso foi remetido ao PS nacional e o ministro da Saúde tomou as devidas medidas, adiantou o socialista Jorge Dantas à Antena Um. Caiu a directora do centro de saúde, Celeste Cardoso, esposa de um vereador independente da autarquia de Vieira do Minho, apoiado pelo PSD. Que fora nomeada para o lugar pelo Governo PSD/CDS, por "manifesto favor político", deixou ontem escapar o ministro da Saúde, numa conferência de Imprensa convocada à pressa para justificar a demissão, já comparada ao afastamento do professor Charrua da Direcção de Educação do Norte.

Correia de Campos negou, contudo, estar em causa qualquer perseguição política. "Não há nenhuma matéria dessa ordem no despacho de exoneração". Apenas a data da sua nomeação, anterior à chegada do PS ao Governo. E garante que Maria Celeste Cardoso "teve todos os prazos para recorrer da decisão e não o fez".

Contactada pelo JN, a ex-directora - e actual funcionária administrativa do centro de saúde - disse não ter querido contar a sua demissão na altura (a 5 de Janeiro) por ser "recatada" e não gostar de "confusão". Isto, apesar de a própria família "querer que seguisse para tribunal". "Sabia que ia acontecer isto que está a acontecer". E só responde "talvez" quando lhe falam em perseguição política.

Classificando de "mentira" algumas afirmações do ministro, Celeste Cardoso desmente que o cartaz "jocoso" - em que o médico Salgado Almeida, vereador da CDU em Guimarães, escreveu "Atenção! Você está num SAP Fuja! Faça como o ministro da Saúde deste pobre país corra para a urgência de Braga!" - tivesse estado exposto "vários dias". "Foi posto na noite da quinta-feira 10 de Agosto. No sábado de manhã, uma funcionária ligou-me a dizer que estava lá um senhor a tirar fotos. Disse-lhe para tirar o cartaz".

Além do PS, a foto chegou à Sub-região de Saúde de Braga a 17 de Agosto, altura em que a directora foi confrontada. Segundo o ministro, Celeste Cardoso foi instada a retirá-lo. Coisa que, garante ela, já fora feita, tal como o fora o inquérito interno que determinou o autor da brincadeira. Que este logo assumiu como um "acto irreflectido, sem intenção de prejudicar o ministro". "Sentia-se indignado por considerar que as declarações do ministro desvalorizavam os funcionários dos SAP". Foi repreendido e o processo entregue à sub-região. Quando esta lhe sugeriu que colocasse o lugar à disposição, recusou fazê-lo. "Não tinha culpa". E diz que nunca lhe foi dito que instaurasse um processo ao médico. Coisa que, de resto, "não faria". "Não havia motivo para tal. Eram declarações do ministro!".

Para o ministro, Celeste Cardoso "desresponsabilizou-se", manifestando "deslealdade para a tutela", prova de que "não reúne condições" para seguir as orientações superiores na implementação das políticas do Ministério. "Demonstrou incapacidade para o exercício do cargo ao não impedir que um espaço de prestação de cuidados de saúde fosse utilizado para a luta política local", lê-se no despacho assinado de 5 de Janeiro. Dois meses antes de a directora terminar a sua comissão de serviço.

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