segunda-feira, 26 de maio de 2008

RTP. Péssima programação

Transcrevo este texto de autor desconhecido recebido por e-mail de remetente identificado.

O drama de Pacheco Pereira, Nuno Brederode … e dos telespectadores da RTP

Chegou à praça pública um tremendo rugido de protesto, implacável e ao mesmo tempo desesperado, contra o estado a que chegou a informação nos telejornais portugueses: Pacheco Pereira perdeu a cabeça (ou usou-a como nunca) clamando contra “A cultura da irrelevância (que) está a crescer exponencialmente” (“Público” de 17 de Maio). E escreve, mortificado: “Futebol, futebol, futebol, fumei, pequei, vou deixar de fumar, a Esmeralda entre o pai afectivo e o pai biológico, futebol, directo do acidente na A1 que provocou três feridos, os pais da pequena Maddie, futebol, tenho um cancro-tive um cancro-vou ter um cancro, futebol, futebol, futebol.”

Dias depois, adesão insuspeita: Nuno Brederode Santos junta a sua pena demolidora às diatribes de Pacheco Pereira para lamentar “… ter de saber que, no hotel do estágio, a ementa de hoje foi canja de galinha e carne à jardineira (e o cozinheiro já vai explicar porquê), mas também que o craque A, afectado por uma ligeira indisposição, comeu pescada.” (“Diário de Notícias” e blogue “Sorumbático” de 25 de Maio).

O ridículo elevado ao delírio? A imbecilidade transformada em cartilha editorial dos telejornais? Pode ser, mas resulta muito pior quando praticados na antena do serviço público – vulgo RTP.

Ora eu, que não ostento de Pacheco e Brederode a fama e glória, também tenho a minha história de rebelião contra este filme de massacre futebolisivo.

Enviei a seguinte carta ao Provedor do Espectador da RTP:

“Senhor Provedor, Às 20 horas de ontem, dia 12 de Maio, os editores do Telejornal já possuíam a notícia e as imagens: oito mil e quinhentos seres humanos tinham morrido, poucas horas antes, num terramoto na China. Sabiam também que novecentas crianças estavam debaixo dos escombros da sua escola. Mais de oitenta por cento das casas de uma grande cidade estavam derrubadas, com gente lá dentro. Os senhores editores do Telejornal sabiam isto tudo às 20 horas. Até porque as grandes cadeias de televisão mundiais ( BBC, Sky e CNN) já tinham transmitido reportagens sucessivas sobre todo esse horror. Parece que uma notícia desta magnitude iria abrir o jornal do serviço público lusitano, com devido trabalho jornalístico. Mas não, senhor Provedor: Os primeiros DEZASSETE MINUTOS do Telejornal foram integralmente dedicados ao anúncio dos jogadores escolhidos para chutar a bola na selecção nacional! Que valem milhares de mortos ao lado da conferência de imprensa do treinador Scolari? Senhor Provedor: Temos o direito, todos os que ainda nos reclamamos da cultura e da inteligência, de ouvir da boca dos editores do Telejornal de ontem as inqualificáveis razões editoriais para tamanho insulto aos espectadores. Por isso me dirijo a V. Exa, que tantas provas de verticalidade nos tem trazido em cada um dos seus excelentes programas. Com a maior consideração, N.”

Chegou resposta, assinada pela chefe de gabinete, D. Fernanda Mestrinho. Em dois secos parágrafos estilo Formulário-Norma-4 agradecia a mensagem e mandava à m…era procura de um programa do Provedor que fora emitido meses antes.

Tenho a certeza cega de que o ponderado Prof. Paquete de Oliveira desconhece esta troca de correspondência, nem que mais não seja pela boçalidade que enforma e ele é, além de inteligente, um homem de finesse.

Que isto se tenha passado assim com um ignoto espectador, diz apenas de quem assessora o Provedor. Mas a coisa fia mais fino quando dois comentadores de nomeada exibem, em dois dos maiores jornais do país, o mesmíssimo cartão vermelho à RTP e… tudo fica na mesma. Aí o povo contorce as mãos, desesperado, e percebe quão majestático é o poder da tv estatal, sem se dignar explicações, mantendo inalterável o rumo soturno do seu navio fantasma. E os telejornais continuam a dedicar os seus primeiros quinze a vinte minutos a banalidades insípidas que rodeiam os treinos da Selecção de futebol em Viseu. Noite após noite, os directos espremem não-notícias, vulgaridades sonolentas, opiniões vazias de passantes sem o menor interesse. E a tal pescada que o jogador comeu, em vez de bife. Puro lixo televisivo. Vejo os telejornais estatais de Espanha, França, Inglaterra e Itália e nenhum se atreve a tamanho desperdício de tempo com tamanhas ninharias das suas selecções de jogadores. Só mesmo a RTP, até à náusea.

E porquê? Acho que sei, e até peço perdão se estou errado.

Sem ofensa pessoal para ninguém envolvido, eu acho que Pacheco e Brederode tiveram apenas um azar de circunstância, que passo a explicar.

A RTP é como o Estado: são todos e ninguém. Preciso é distinguir quem vale e quem não vale. O segurança da RTP não vale para definir telejornais, mas há três pessoas que valem tudo para definir os conteúdos dos telejornais: o Zé, o Luís e a Cristina. Se eles lerem os dois cronistas e se a sua roda de amigos concordar com os cronistas e comigo, tudo vai mudar no telejornal desta noite. O país, em vez de vinte minutos de nha-nha de Viseu, só grama dois ou três minutos de nha-nha de Viseu, se gramar!

Basta que o Zé tome café com o Luís e a Cristina e se ponham de acordo. Podia ser: o Zé Alberto é director de Informação e até pode decidir sozinho. Mas como a matéria é gravíssima para os interesses estratégicos de Portugal, admito que não queira utilizar o seu formidável poder sem ouvir o Luís Marinho que era seu chefe até ontem mas hoje é administrador da empresa. Os dois teriam quórum mais que bastante para colocar o terramoto da China antes das canelas do Petit a abrir o telejornal, mas vamos supor que isso teria implicações formidáveis no orçamento da TV pública e portanto conviria ouvir a Cristina Viegas, a sempre presente directora do subdepartamento comercial da empresa. Que diabo, a campanha publicitária que tem Nuno Gomes aos saltinhos e gritinhos poderia estar-se nas tintas para os mortos na China e exigir prioridade a Viseu Petit.

Portanto, seria superiormente recomendável um cafezinho a três – o Zé, o Luís e a Cristina. Belém reúne o seu Conselho de Estado por bagatelas bem menores do que o primeiro quarto de hora do Telejornal.

Simples, não é? Tudo arrumado em dez minutos de um café de bom senso. Pois não senhor: isso jamais acontecerá. O drama de Pacheco, Brederode e de todos os espectadores da RTP é que um dos três – acho eu – não gosta de café.

8 comentários:

Pata Negra disse...

O tempo dessa TV que aqui se exige já passou. Sinceramente, já quase só utilizo a TV para ver a série Friends na dois. De quando em vez alguém me fala de algo bom, do género ou de outro, e eu tento.
De resto, estou-me nas tintas para a TV, agora mesmo, estou aqui a comentar este blog e sinto-me bem, o resto da família está em outros PCs e sente-se bem. Ah, dirão, mas perde-se o convívio da família à volta da TV. Quero lá saber, disseram o mesmo da TV, que se perdia o serão à lareira e o terço, e continuamos aqui. O facto da TV ser de má qualidade tem proporcionado mais convívio. O que tem prejudicado mesmo a vida em família é o facto de cada vez trabalharmos mais horas, os pais para o emprego e os filhos para a escola.
Lutemos por uma sociedade que dê mais tempo às pessoas, a TV e a Net que se lixem! Quanto á selecção direi apenas: não consumo ópio!
Um abraço com a televisão desligada e a malta a brincar com computadores - se amanhã não chover vamos todos arrancar batatas!

A. João Soares disse...

Majestade,
Uma atitude salutar a sua, com repúdio à droga das TVs. Mas isso não elimina o mal que ela faz à maioria das pessoas que são escravas do pequeno ecrã.
Não instrui, nem educa e mal informa, simplesmente estupidifica.
Transcrevo o comentário de outro blog sobre o mesmo post: Se tiveres oportunidade, faz uma leitura rápida do livro «Clube Bilderberg, os senhores do mundo», de Daniel Estulin, editado pelo Circulo de Leitores em 2005, e recentemente noutra editora. Ficarás a saber como a Comunicação Social está a ser utilizada como arma.
Nada é descurado nessa estratégia. Repara que o único português membro do clube é Pinto Balsemão por ser o maior industrial português da CS, e que todos os ministros com tutela da Televisão têm sido convidados para as reuniões anuais do Clube.
Deves estar a compreender!
O povo está anestesiado, como o está perante o avanço de múltiplos meios de controlo das pessoas com a desculpa de que estão a defender-nos do terrorismo!
O mundo está a caminhar para um buraco terrível.
Abraço
A. João Soares

Amaral disse...

João
Sem dúvida nenhuma a nossa televisão (na generalidade) não presta. Salve-se um ou outro programa e nada fica. Veja-se o caso do canal 2 da RTP; com uma programação assaz aceitável e não é vista. Porquê? Porque como diz o povo "com papas e bolos se enganam os tolos" e como diria o outro "é disto que o meu povo gosta".
Abraço

A. João Soares disse...

Amaral,
Nos primeiros passos da TV, havia uma função didáctica muito útil, desde o português até aos cuidados básicos de saúde, à condução segura e prudente, à agricultura, etc. etc. O povo aprendia muita coisa. Mas agora não existe nada disso e, provavelmente, se existisse, ninguém via.
O povo já não é o mesmo e cada povo tem a TV que merece. Mas devia fugir-se à massificação e ter programas para sectores pouco numerosos de pessoas com gostos mais dedicados à ciência, à cultura, às artes, etc.
Um abraço
João

ANTONIO DELGADO disse...

CAro A. João Soares,

Juro que não é por snobismo que afirmo o seguinte: é muito raro ver a televisão nacional e os seus canais. Também é raro ler a imprensa portuguesa, por estreita de informação e critica. Há anos que os jornalistas e políticos ou "opinion makers" se passeiam da televisão para os jornais e destes para a televisão num círculo fechado que não areja o meio nem a mente a quem os ouve (será que se quer arejar?). A prática tem inquinado qualquer informação séria. Não digo com isto que não haja excelentes profissionais, sejam de opinião, sejam realizadores de programas o problema é que eles se perdem no meio de tanta sub-vulgaridade. O aspecto que referi tem feito que no nosso país funcione a única ideologia possível o "futebolismo".

Ela está a transforma-lo na réplica europeia do Brasil tal como o Brasil foi a réplica de Portugal no América do sul no século XVIII e principio do sec. XIX. E também a transforma-lo num paraíso de "BRINCAS NA AREIA". Alias , ao nível do futebol, foi-se buscar um treinador ao país irmão para o doutrinar no "FUTEBOLISMO": nem no tempo de Salazar se falava e via tanto futebol! Por este andar ainda verei a selecção e toda a comitiva irem a Fátima, de romaria, para se despedirem da virgem e a ela se encomendarem antes de partirem para ao campeonato ou lá o que seja. Se o treinador já conseguiu pôr quase todos os portugueses com bandeiras nacionais nas janelas, brevemente irá pô-los com a uma figura da virgem ao lado da bandeira ...é apenas uma questão de tempo... E lá vamos cantando e rindo!

Um abraço fraterno
António

A. João Soares disse...

Caro António Delgado,
Transcrevo a resposta que lhe dei no
Do Miradouro:
Caro António,
A sua atitude de se afastar da droga das TVs é salutar. É grande o mal que ela faz à maioria das pessoas que são escravas do pequeno ecrã.
Não instrui, nem educa e mal informa, simplesmente estupidifica.
Nos seus primeiros passos a TV, exercia uma função didáctica muito útil, desde o português até aos cuidados básicos de saúde, à condução segura e prudente, à agricultura, etc. etc. O povo aprendia muita coisa. Mas agora não existe nada disso e, provavelmente, se existisse, ninguém via.
O povo já não é o mesmo e cada povo tem a TV que merece. Mas devia fugir-se à massificação e ter programas para sectores pouco numerosos de pessoas com gostos mais dedicados à ciência, à cultura, às artes, etc.
É estranha a influência que ela exerce nas mentes menos esclarecidas, como as dos políticos, levando a uma linguagem futeboleira, por este desporto estar a ser usado intencionalmente para anestesiar o povo.
O livro referido num comentário anterior ajuda a compreender muita coisa que está acontecendo cá e lá fora. Mas cá acontece com mais rapidez e intensidade, dado o baixo nível cultural das pessoas.

Um abraço
João

rui neves disse...

Hoje, 25 de Abril de 2009, são 23H40, pois este programa da RTP1 só falam nos Capitães de Abril, e muito bem. Neste programa não se falou nos homens que com eles,( soldados, que participaram na revolta, porquê?
Foram só os capitães que fizeram a revolução?
Não sabia que se fazia pão de ló sem ovos...!

A. João Soares disse...

Caro Rui Neves,
Sem dúvida que os soldados estavam lá. Onde há um capitão em funções normais, há mais de uma centena de soldados, sargentos e subalternos.
E, já que dá a imagem do pão de ló, conheço duas marcas tradicionais, o pão de ló de Loures e o de Margaride, mas ninguém fala nos ovos. Quando se fala num automóvel Mercedes e na respectiva estrela, não se fala nos tapetes, ou no revestimento da manete da caixa de velocidades.
Já reparou como seria fastidioso, quando se fala de Salgueiro Maia dizer a lista dos muitos soldados que iam sob o seu comando?
É como falar do Governo ou do PS e referir todos os seus elementos.
Quando algum se distinguir individualmente então não deve deixar de se citar o seu nome e alguns dados pessoais.
Obrigado pela visita.
Volte mais vezes.
Um abraço
João Soares