segunda-feira, 6 de abril de 2009

Factos e conselhos, por Mário Crespo

É sempre útil saber como os outros nos vêem (...) até porque os estragos que todos estes anos de atraso [no caso Freeport] causaram a Portugal são já muito profundos.

Despacho da Agência France Press enviado de Lisboa na passada quarta-feira (tradução minha do original em Francês): EUA0298 4 PJ 0348 PRT /AFP-ZR97 Portugal-GB-politique-justice-corruption-UE

Freeport: accusé de pression, le président d'Eurojust convoqué à Lisbonne

LISBONNE, 1 avr 2009 (AFP) - Segundo fontes judiciais o presidente do Eurojust, José Luís Lopes da Mota, foi chamado quarta-feira pelo Ministério Público português depois de ter sido acusado de exercer pressões na questão do Freeport, um caso de presumida corrupção que implica o primeiro-ministro José Sócrates. Segundo informações recebidas pela Agência France Press do gabinete do Procurador, monsieur Lopes da Mota, um magistrado português eleito em 2007 para a direcção do Eurojust, tem um encontro agendado para as 15H30 (14H30 TMG) pelo procurador-Geral da República Fernando Pinto Monteiro.

Segundo informações divulgadas na Imprensa portuguesa, monsieur Lopes da Mota foi posto em causa no princípio da semana pelos magistrados responsáveis pelo inquérito no caso Freeport. Freeport é o nome de um centro comercial construído em 2002 numa zona protegida na altura em que monsieur Sócrates era ministro do Ambiente.

Numa declaração à rádio TSF, monsieur Lopes da Mota, que na altura do despacho autorizando a construção do Freeport era secretário de Estado da Justiça, desmentiu "ter feito qualquer pressão ou interferência neste caso".

O caso Freeport, que eclodiu em 2005 com base numa carta anónima em que monsieur Sócrates é acusado de corrupção, está a ser objecto de inquéritos judiciais simultaneamente em Portugal e no Reino Unido, onde está sediado o grupo Freeport.

Enquanto presidente do Eurojust, a organização de coordenação judiciária da União Europeia, "o meu trabalho é apoiar a cooperação entre Portugal e o Reino Unido", precisou monsieur Lopes da Mota à TSF e disse que as acusações que lhe fazem são "absurdas".

Adormecido durante vários anos, o caso Freeport reapareceu em Janeiro último após ter sido enviada às autoridades judiciais portuguesas uma carta rogatória da Polícia britânica em que monsieur Sócrates é nomeado como sendo suspeito.

Candidato a um segundo mandato nas eleições do próximo Outono, o chefe do Governo socialista português desmentiu repetidamente o seu envolvimento neste caso e denunciou que há uma campanha com fins eleitorais para o denegrir.
alc/tsc/dfg
AFP
011129 GMT AVR 09

Este é o mais recente de umas dezenas de despachos noticiosos sobre o caso Freeport em que, na linguagem fria e desapaixonada das agências, as suspeitas sobre o Governo português e, mais recentemente, sobre todo o sistema de justiça em Portugal, são descritas para todo o Mundo ler em vários idiomas. É má a imagem do país que sai disto.

Destes factos decorrem três conselhos para a procuradora Cândida Almeida, responsável pelo inquérito:

1. Seja célere. Os estragos que todos estes anos de atraso causaram a Portugal são já muito profundos.

2. Não se ria quando fala com repórteres sobre este assunto. Nada disto é engraçado. Está em causa a respeitabilidade de um país e discute-se a honorabilidade de um chefe de Governo. Não tente aligeirar o que não é aligeirável.

3. Ofereça o estatuto de arrependido e as consequentes imunidades a Charles Smith para ele contar toda a verdade. Já fez isso com sucesso quando tutelou o inquérito às FP25. O caso Freeport não é menos grave para o Estado português.

publicado no JN em 6 de Abril de 2009, por Mário Crespo

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