Transcrição de artigo recebido por e-mail de pessoa amiga:
Ainda há coisas que se podem fazer
Público. 03-05-2011. Por José Vítor Malheiros
A ideia populista de que os ricos devem ser penalizados pelo uso do SNS (Serviço Nacional de Saúde) é o primeiro passo para a sua destruição.
Não vivemos um normal tempo de crise onde sabemos que a normalidade irá acabar por regressar como o bom tempo depois de uma tempestade. Esta não é uma crise de onde sabemos que sairemos mais fortes porque teremos sobrevivido e porque teremos aprendido a não repetir os últimos erro. Esta é uma crise onde não só não sabemos para onde vamos como também não sabe-mos para onde poderíamos ir. Esta é uma crise da qual ninguém sabe como sairemos nem sequer se sairemos dela. Esta não é a crise que se vai transformar na finest hourda União Europeia como desejávamos mas aquela onde os agiotas reunidos em Londres e em Frankfurt tentam proceder à última fase da lobotomia da civilização apagando o Estado Social dos programas eleitorais de todos os partidos. Uma questão de realismo, dizem. Vocês não têm dinheiro para isso sussurram-nos ao ouvido. Nós faremos um melhor serviço a gerir os vossos hospitais, as vossas reformas, os vossos exércitos, as vossas prisões os vossos partidos.
Esta crise não é uma batalha perdida, mas uma guerra perdida, onde a única possibilidade é reagrupar as forças no exílio organizar a resistência clandestina e prepararmo-nos para um longo combate.
Esta crise é o tempo de todos os charlatães e de todas as mentiras porque haverá sempre algo mais a extorquir dos contribuintes que se deixarão expoliar voluntariamente.
Porque alguém lhes disse que isso era inevitável. Porque alguém lhes disse que a política era um luxo impossível que só a economia deve tomar decisões sobre as nossas vidas que só a desumanidade garante a eficiência e que a desigualdade é a única justiça e a igualdade uma injustiça. Orwell ficaria boquiaberto com a sua presciência.
Mas neste momento em que não sabemos o que pensar, o que propor, há ainda coisas fundamentais que podemos fazer. Como defender o Serviço Nacional de Saúde, com unhas e dentes, por exemplo, sem aceitar os argumentos das empresas (e dos seus partidos), que acham que este é um negócio tão ruinoso para o Estado… que preferem ser elas a fornecê-lo.
Numa entrevista recente ao “Público” o líder social-democrata Miguel Relvas defendeu que a filha do homem mais rico de Portugal não pode pagar nove euros por uma consulta num hospital público pagando o mesmo que a filha de um desempregado. Não é justo dizia.
Vale a pena reflectir na proposta.
Antes de mais, o sistema é justo porque a família mais rica de Portugal já paga muito mais do que a família do desempregado para o SNS: paga através dos seus impostos (ou pagaria se todos os partidos quisessem). Por outro lado, se uma taxa moderadora progressiva desincentivar os mais ricos a aceder ao SNS e a escolher serviços privados, o SNS transformar-se-á no “serviço dos pobres”, abrindo a porta a todos os ataques à sua manutenção e melhoria (menos utilizadores, menor pressão social para a sua melhoria, utilizadores mais facilmente silenciados, etc.). De facto, se se pretende um serviço de saúde de qualidade, é fundamental que ele sirva todos em condições de igualdade, ricos e pobres sem distinção. Só desta forma toda a sociedade se empenhará, colectivamente, na sua defesa.
A ideia populista (aparentemente socialista mas de facto profundamente reaccionária) de que os ricos devem ser penalizados pelo seu uso dos serviços públicos é o primeiro passo para a destruição desses serviços públicos e para reforçar uma saúde (uma educação, uma…) a duas velocidades: uma privada, de qualidade; uma pública de subsistência. Os ricos devem ser tratados exactamente como os pobres - nem pior nem melhor - e só assim a defesa do serviço público será uma preocupação de todos. Ao contrário do que pretendem alguns, só a igualdade no acesso promove a qualidade.
José Vítor Malheiros (jvmalheiros@gmail.com)
Imagem do Google
Rapidinhas de História - Livros
Há 30 minutos
4 comentários:
Este foi o comentário que deixei em "Foi por Bem" e "Miradouro":
Bem, lá vou eu meter a foice em seara alheia ... Não estou de acordo...
Como pode ser possível um rico pagar o mesmo que paga um pobre, num hospital? Concordaria com isso SE esse pagamento, fosse feito em determinado período dum processo de igualdade social. Aí sim. Enquanto tal não fôr o caso, cada pessoa deverá pagar em função da sua receita semanal/mensal.
Estou de acordo que, a ser diferente o valor a pagar, seria catastrófico para o SNS, mas isso só acontece porque há toda uma política financeira injusta e inadequada a gerir o país. Se houvesse uma gestão financeira, adequada, nem teríamos, sequer, que pôr em causa quanto deveria pagar o rico e o pobre, pois ambos teriam dinheiro para pagar uma consulta de valor tão irrisório ... Mas fico-me por aqui, pois isto é só a pontinha dum novelo rico em fios cortados ...
Amiga Mizita,
Agradeço o seu comentário. Em problemas de tal complexidade evito dar opinião, para poder independentemente observar a questão por todos os lados e aprender com o que outros dizem. Concordo consigo, pois em casos extremos de carência financeira o doente deve ser tratado por contra do Estado. Mas o critério a utilizar tem que ser devidamente definido para não haver habilidosos que queiram ter os benefícios como se fossem pobres.
Há tempos apareceu na TV um homem rico que tinha sido presidente do S L Benfica e que afirmou não pagar RIS. Ora trata-se de um empresário da construção civil e leva uma vida do Jet Set. Como compreender??? Este nem sequer deve pagar a taxa moderadora no SNS !!!
É interessante seguir a argumentação para para soluções opostas! E, a propósito, fui solicitado a reflectir se Osama Bin Laden será diabo ou santo e numa primeira aproximação compreendo que haja quem defenda uma e outra hipóteses. As ideias são de um encanto atraente.
Beijos
João
Sempre Jovens
Esta análise última, que refere, poderia ter uma ou outra respostas credíveis, aceitáveis, se credível fosse tudo o que se diz e se aceitável fosse o juízo que cada um pudesse fazer a respeito.
Meu amigo, tenho lido e visto muito que possa ter-me feito chegar à conclusão de que vivemos num mundo onde a degradação começa a ser quase incomensurável e a reconstrução uma utopia.
Pode ser que amanhã eu chegue à conclusão de que não estou a ficar tão magoada assim com certos dramas que me impossibilite de acreditar ..., acreditar ..., acreditar?
Um abraço e bom fim-de-semana.
Amiga Mizita,
Compreendo o seu pessimismo e reconheço que a humanidade está a degenerar e a descer para uma abismo imprevisível. Por vezes penso que estou a ficar demasiado atraído pela racionalidade o que pode tapar a saída para a esperança de recuperação dos valores de outrora e isso é perigoso porque a esperança deve ser a última coisa a morrer.
Quero ter esperança e aceitar a utopia mesmo que seja em pequena dose. Estou confiante de que, se cada um fizer um pouco no sentido de melhorar a humanidade, ficaremos felizes ao notar pequenos sinais positivos que podem ser a semente de um Mundo Novo.
Por exemplo, fiquei muito feliz ao ver o caso citado em Combater a burocracia e a corrupção.
O mundo tem avançado com subidas e descidas, quedas e recuperações. e podemos estar em vésperas de desenvolvimentos positivos. As pequenas notícias de progressos na ciência, na saúde, na tecnologia são animadoras. As mentalidades também evoluirão, como se vê no que aconteceu na Tunísia e no Egipto e o que está a acontecer na Líbia, na Síria, no Iémene, etc. O povo está a abrir os olhos e a ter a noção dos caminhos diferentes que conduzirão a uma vida melhor.
Por cá ainda não houve um despertar prometedor, mas a crise vai dar oportunidade de as pessoas aprenderem o que vale mais na vida e a saberem gerir todos os seus actos da forma mais correcta... Espero que não me engane!!!
Beijos
João
Sempre Jovens
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