domingo, 3 de dezembro de 2006

Conselhos de seniores ou de sábios são necessários

Nas sociedades tradicionais africanas o soba, responsável máximo da tribo, antes de tomar decisões importantes para a colectividade a que preside, tem o cuidado de se aconselhar junto do «conselho de sábios», constituído pelos idosos que já não podem trabalhar mas que têm larga experiência da vida e muito tempo para meditar serenamente nos problemas existenciais da sua tribo.

Quando se fala nisto há muita gente que considera isso como um sinal de atraso dessas sociedades que ainda não conhecem os efeitos da modernidade. Porém, uma observação mais atenta das notícias que nos chegam conduz-nos a concluir que muitos responsáveis por cargos supostamente de grande relevância, andaram todo o tempo do seu mandato a leste das realidades e só depois de saírem ou quando estavam em vésperas de sair é que se aperceberam dos sérios problemas que deviam ter resolvido.

Parece anedota mas não é. O ex-Presidente da República, depois de ter abandonado o cargo apareceu nos meios de comunicação social a emitir opiniões com um calor que não se lhe conhecia antes, como se apenas agora se apercebesse da existência dos problemas. Havia quem comentasse que ele estava com dificuldade em despir o casaco de Presidente. E não é só ele, acontecendo coisa um pouco parecida com Clinton e com Al-Gore.

Agora surge o CEMGFA Mendes Cabeçadas, em vésperas de ser substituído, a fazer afirmações como:
«as medidas restritivas recentemente desenhadas para os militares partem do FALSO PRESSUPOSTO de os militares se encontrarem em igualdade de condições com os funcionários civis»;
«Entre os militares e os funcionários civis não existe identidade alguma»;
«A condição militar traduz-se num complexo de deveres e direitos interligados numa simbiose indissociável».
Como se estas afirmações não devessem ter sido feitas há vários anos antes de ele ter consentido, pelo seu silêncio e conivência, que as coisas se agravassem.

Estes casos mostram que os sábios, depois de se libertarem das amarras da hierarquia que os condiciona, sabem raciocinar melhor, com maior clarividência e lucidez, conseguindo ver aquilo que todos acham natural e lógico e que até aí eles não conseguiam ou não tinham coragem para descortinar. Seria, por isso, de todo conveniente a criação em cada instituição de conselhos de sábios ou de seniores, que pudessem, em cada instituição facultar pareceres aos responsáveis pela gestão diária dos problemas, à semelhança do que se passa nas tribos africanas.

Pela minha experiência de professor em regime de voluntariado em academias para a terceira idade (UITI, Academia de Seniores de Lisboa e Academia Saudação), posso afirmar que, entre os idosos, há gente com espírito jovem aberto à aprendizagem, com grande sedimento de experiência, e notável capacidade de emitir opiniões muito sensatas e válidas para a resolução de problemas de todos os tipos.

Sobre este tema, sugere-se a leitura do texto «Chefes alertam para perigo das restrições militares», aqui inserido em 29 de Novembro.

2 comentários:

A. João Soares disse...

RCEBIDO POR E-MAIL COM PEDIDO DE PUBLICAÇÃO AQUI:

Meu amigo

Permita-me a ousadia de repetir aqui o comentário que já fiz na "Voz do Povo".

"Muito bem meu amigo!

Aplaudo de pé!

Isso foi o que sempre defendi.

Não existem cursos no mundo inteiro que cheguem aos pés da sabedoria adquirida com aquela que se obtém com o passar dos anos. Por isso, desde criança, sempre que tinha uma oportunidade de ouvir os “mais velhos” falarem e contarem coisas que para mim eram novidade, eu não trocava por nada.

Os atrasados, quanto a mim não são aqueles lá nas tribos de África que respeitam quem tem mais idade, ouvem e praticam os seus conselhos, são antes os que ainda, muitas vezes, ainda não saíram das “fraldas” e já acham que sabem tudo.

E é também por isso que Portugal jaz na ignorância, pois em vez de ouvir aqueles que já passaram por muito, acham sempre que o sinónimo de idoso é “estar ultrapassado”.

Pobres de nós quando denegrimos as origens, as tradições, esquecendo-nos que nas raízes temos os alicerces.

Não sou contra a inovação, mas sou contra o desapego total pelas coisas boas que se construiu no passado. Com sabedoria (em grande medida pertença dos mais velhos) podemos estabelecer a ponte entre o ontem, o hoje e o amanhã.

Tenho 42 anos e agradeço a todos aqueles que sendo mais velhos que eu (ou não) me ensinaram permitindo que eu crescesse em conhecimento e em sabedoria, e convido a todos aqueles que quiserem continuar a ensinar-me coisas construtivas, que o façam."

Com amizade

Alexandra Caracol

A. João Soares disse...

Um pequeno aditamento interessante

Em conversa sobre este texto com o meu amigo Taborda S, e perante a minha pergunta sobre o que impede os detentores de cargos de responsabilidade de verem as soluções dos problemas em tempo útil e de só acordarem para elas quando cessam funções, respondeu-me que não se trata de não verem mas do receio de hostilizarem o «patrão» a quem dedicam obediência, conivência, cumplicidade e gratidão pelo lugar que ocupam, sentindo-se na obrigação de não ir de encontro aos seus desejos e propósitos, agindo com acentuada cobardia, como «yess men», mas que, ao sentiram-se livres desses receios, apressam-se a soltar aquilo que recalcaram durante as funções. Porém, se isto não evidencia dignidade e honestidade moral, é pior o caso de, à última hora, decidirem muita coisa para as quais não tiveram coragem durante as funções, com falta de lealdade para com o substituto que irá ficar com a batata quente nas mãos. Pretendem dar razão ao ditado «atrás de mim virá quem bom de mim fará».
A. J. Soares