terça-feira, 19 de junho de 2007

Pedra Filosofal

De António Gedeão

Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul
Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho alacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
(que fossa através de tudo)
num perpétuo movimento.

Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, ou capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é Cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Columbina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida.
Que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.

É bom recordar estes versos que são tópicos de biologia, história, tecnologia, evolução nascida do sonho, filosofia da vida, fantasia, elevação.

3 comentários:

Amaral disse...

João Soares
são versos disso que enuncia e não só: teatro, pintura, física...
Este é dos mais belos poemas desse grande autor Gedeão (ou se quisermos esse grande professor de FQ, Rómulo de Carvalho).
É engraçado é um poema sempre actual. Veja-se que Gedeão se refere a "eles" sem dizer quem são; "eles" que não sabem nem sonham; são uns ignorantes.
Será que Gedeão escreveu esta pérola a pensar nos políticos?
Abraço

A. João Soares disse...

Caro Amaral,
Talvez a pensar na ignorância os políticos e na ideia fixa dos gananciosos que vivem preocupados apenas com o vil metal e com as coisas materiais, sem sonhos elevados, espirituais.
Abraço

Anónimo disse...

Estes versos são magníficos...dos meus preferidos!

Abraço
MR