quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Correcções políticas a introduzir no País

Texto publicado no semanário Expresso, pelo General Garcia Leandro

O modo como se tem desenvolvido a vida das grandes empresas, nomeadamente da banca e dos seguros, envolvendo BCP e Banco de Portugal, incluindo as remunerações dos seus administradores e respectivas mordomias, transformou-se num escândalo nacional, criando a repulsa generalizada.

É consensual que o país precisa de grandes reformas e tal esforço deve ser reconhecido a este Governo (mesmo com os erros e exageros que têm acontecido).

Alguém tinha de o fazer e este Governo arregaçou as mangas para algo que já deveria ter ocorrido há muito tempo. Mas não tocou nestes grandes beneficiários que envergonham a democracia, com a agravante de se pedirem sacrifícios à generalidade da população que já vive com muitas dificuldades.

O excesso de benefícios daqueles administradores já levou a que o próprio Presidente da República tivesse sentido a obrigação de intervir publicamente.

Mas tudo continua na mesma; a promiscuidade entre o poder político e o económico é um facto e feito com total despudor.

Uma recente sondagem Gallup a nível mundial, e também em Portugal, mostra a falta de confiança que existe nos responsáveis políticos deste regime.

Tenho 47 anos de serviço ao Estado, nas mais diferentes funções de grande responsabilidade, sei como se pode governar com sentido de serviço público, sem qualquer vantagem pessoal, e sei qual é a minha pensão de aposentação publicada em D.R.

Se sinto a revolta crescente daqueles que comigo contactam, eu próprio começo a sentir que a minha capacidade de resistência psicológica a tanta desvergonha, mantendo sempre uma posição institucional e de confiança no sistema que a III República instaurou, vai enfraquecendo todos os dias.

Já fui convidado para encabeçar um movimento de indignação contra este estado de coisas e tenho resistido.

Mas a explosão social está a chegar. Vão ocorrer movimentos de cidadãos que já não podem aguentar mais o que se passa.

É óbvio que não será pela acção militar que tal acontecerá, não só porque não resolveria o problema mas também porque o enquadramento da UE não o aceitaria; não haverá mais cardeais e generais para resolver este tipo de questões. Isso é um passado enterrado. Tem de ser o próprio sistema político e social a tomar as medidas correctivas para diminuir os crescentes focos de indignação e revolta.

Os sintomas são iguais aos que aconteceram no final da Monarquia e da I República, sendo bom que os responsáveis não olhem para o lado, já que, quando as grandes explosões sociais acontecem, ninguém sabe como acabam. E as más experiências de Portugal devem ser uma vacina para evitar erros semelhantes na actualidade.

É espantosa a reacção ofendida dos responsáveis políticos quando alguém denuncia a corrupção, sendo evidente que a falta de vergonha deve ser provada; e se olhassem para dentro dos partidos e começassem a fazer a separação entre o trigo e o joio? Seria um bom princípio!

Corrija-se o que está errado, as mordomias e as injustiças, e a tranquilidade voltará, porque o povo compreende os sacrifícios se forem distribuídos por todos.

GENERAL GARCIA LEANDRO
(Artigo do semanário "Expresso" )

5 comentários:

A. João Soares disse...

Obrigado pela visita,
A situação está péssima. Os políticos são ambiciosos egoístas para quem, a população representa o mesmo que a relva dos estádios representa para os futebolistas: serve para ser pisada sem qualquer contemplação. O tal défice foi criado pela incompetência de governantes, mas quem sofre é o povo desprotegido e pobre e, o que é pior é que esse sofrimento tem sido agravado sucessivamente em vez de ter sido rápido e ter dado os esperados frutos. Mas nada melhorou visivelmente, porque se o povo paga mais, os parasitas aumentaram a voracidade, com mais formas de mamar, com mais assessores, mais carros topo de gama, mais viagens ao estrangeiro, mais festanças opulentas, mais tachos, mais corrupção. Esta, como diz o bastonário da ordem dos advogados, é uma realidade, como comprova o caso de ter havido políticos a requerer para que a sua declaração de rendimentos não seja publicada. E não há conhecimento de o enriquecimento destas sanguessugas e seus familiares estar a ser investigado judicialmente. A impunidade dos políticos é escandalosa. Protegem-se uns aos outros e mantêm a confiança uns nos outros, num conluio mafioso. O Director da PJ diz que há erros na constituição de arguidos, o que retira a pouca confiança que havia na Justiça, mas o ministro diz que mantém a confiança nele. Nós é que já não podemos ter confiança em tal ministro.
É preciso que se fale destas coisas, que o povo pense, que se prepare para votar conscientemente, por opinião própria e não por obediência a pessoas pouco honestas.
Para a solução não precisa de se contratar um «treinador» estrangeiro, como acontece no futebol, bastando que o Estado emagreça, seja governado com uma equipa pequena com espírito de serviço público honesto, sem favores a assessores que só aumentam o tráfico de influências, reduzir ao mínimo as nomeações por confiança e passar a escolher os colaboradores através de concurso público aberto aos mais aptos do País, actuar implacavelmente contra a corrupção e ao enriquecimento ilegítimo dos políticos e de quem a eles está ligado, controlar minuciosamente as declarações de rendimentos e torná-las públicas, acabar com a impunidade dos políticos, tornar as leis iguais e aplicáveis a todos, acelerar a Justiça e criar prestígio nos tribunais, etc
Cumprimentos

Amaral disse...

João
Interessante este artigo do General Garcia Leandro. Só é pena que dizendo ele que tem tanta vergonha e podendo "ex pulpito" (leia-se jornal expresso) dizer o que diz que ainda se acomode e fique à espera.
Pessoas assim devem mexer-se e fazer mexer os outros, porque o país necessita de um grande safanão. Já vai sendo tempo de acabar com a promiscuidade.
Bom fim-de-semana
Abraço

A. João Soares disse...

Amaral,
Parece que não estamos em época de grandes safanões violentos que traumatizem o País (pessoas). A história portuguesa do século XX demonstra que essa solução raramente é eficiente.
Será preferível «minar» o sistema podre até ao ponto de fazer a colheita. Será uma actividade demorada mas perseverante sem desfalecimento, para preparar o safanão.
Um caminho para a recuperação de Portugal poderá consistir, como digo no comentário anterior, em fazer emagrecer o Estado, para que seja governado por uma equipa pequena com espírito de serviço público honesto, sem favores a assessores que só aumentam o tráfico de influências, reduzir ao mínimo as nomeações por confiança e passar a escolher os colaboradores através de concurso público aberto aos mais aptos do País, actuar implacavelmente contra a corrupção e ao enriquecimento ilegítimo dos políticos e de quem a eles está ligado, controlar minuciosamente as declarações de rendimentos e torná-las públicas, acabar com a impunidade dos políticos, tornar as leis iguais e aplicáveis a todos, acelerar a Justiça e criar prestígio nos tribunais, etc.
À semelhança do que pretendem fazer com os funcionários públicos, os políticos devem ser responsabilizados e avaliados segundo a eficiência com que executam as tarefas programadas previamente e serem sancionados por tribunais isentos e imparciais.
Com critérios transparentes deixa de haver défice e o povo passa a ter melhores condições de vida.
Haja vontade dos políticos e tudo se resolverá sem revoluções sangrentas.
Bom fim-de-semana
Abraço

Jorge P. Guedes disse...

Tive aoportunidade de assistir a uma parte da entrevista do General à SIC-N ainda há poucos dias.
Fiquei realmente muito agradado pela postura serena, firme e descomprometida com que tratou a verdade das coisas no país.
A ver vamos se não lhe calam a boca.

Um abraço.

Jorge Guedes

A. João Soares disse...

Caro Jorge Guedes,
A sua impressão parece estar correcta. Embora não tenha conhecimento pessoal seguro, sei que este general tem desempenhado variadas funções de alto nível que lhe deram saber consolidado de estratégia e diplomacia que permitem dizer coisas difíceis com a serenidade de quem sabe de que está a falar. E, sobre os políticos, tem a vantagem de pensar antes de falar, pensar nos efeitos futuros daquilo de que hoje fala. É a aplicação das técnicas de Estado-Maior que aprendeu em Pedrouços, no antigo Instituto de Altos Estudos Militares.
Pode não ter a coragem física de um Eanes ou de um Jaime Neves, mas é muito superior em sabedoria estratégica, organizativa e logística.
Portugal precisa de homens com tais predicados.
Um abraço