segunda-feira, 24 de março de 2008

Arceolindo Maria Cardoso deixou-nos

A notícia chegou, dolorosa, embora não totalmente inesperada, porque há meses que era conhecido o seu complicado estado de saúde. É menos um companheiro para os nossos almoços dos equinócios e dos solstícios.

Recordo os anos de 1959-61 quando, na Guiné éramos companheiros do quarto número um no «comboio» de Santa Luzia, onde mais tarde veio juntar-se a nós outro Cardoso, o Rui.

O primeiro comandante de tropas destacadas em Bedanda, a sua viagem de regresso em que houve um ligeiro despiste de uma viatura que o Comandante–chefe quis transformar num bicho de sete cabeças devolvendo o auto para fazer acareações inúteis, apenas para mostrar que era exigente. Tudo acabou bem.

Mas a recordação mais constante era a do bom trato do Arceolindo, a sua sensatez, capacidade de diálogo, poder de convicção, vocação para mediador nos atritos entre os amigos, apetência pela cultura e pelo estudo, gosto pelos pensamentos elaborados.

Os tempos passaram, cada um levou a sua vida e a dele foi encarreirada pela Guarda Fiscal, onde também deixa amigos. E, quando a idade começou a fazer nascer, ao lado dos cabelos brancos, a saudade da juventude, e o Simões Vagos iniciou a organização dos três almoços anuais da alferezada da Guiné, que depois passaram a quatro anuais, conforme as festas das religiões pagãs, o Arceolindo lá estava, apesar da dificuldade de locomoção, transportado pelo filho dedicado que, nesses dias, deixava os seus afazeres para o trazer de Peniche até à porta do Restaurante Baleal, na Rua da Madalena onde o vinha buscar findo o convívio. Nos últimos encontros já se sentia que fazia grande esforço físico, embora o fizesse com o prazer de estar connosco.

Arceolindo, partes com a certeza de que deixas muitos amigos, tantos quantos aqueles que te conheceram, tal era o teu bom carácter e a tua afectividade. Repousa em paz, naquela paz que os Bons merecem.

À família enlutada deixo aqui o acompanhamento na dor de o deixarmos, envio sentidos pêsames pelo seu sofrimento, por perderem um marido, pai, sogro, avô, que foi gentil e amoroso. Com os companheiros da Guiné solidarizo-me no pesar pela perda de mais um dos nossos amigos que se adiantaram a nós nesta última etapa da vida. A todos cumprimento.

3 comentários:

SILÊNCIO CULPADO disse...

A.João Soares
Não conhecia a senhora mas lamento. É sempre doloroso perder um amigo.

Um abraço

A. João Soares disse...

Silêncio Culpado,
Obrigado pelas suas palavras. Um amigo, colega de momentos difíceis, com quem troquei muitas opiniões sobre os muitos livros que líamos e que nos serviam de lenitivo para a solidão distante de todos os entes queridos familiares. Livros que eram digeridos e saboreados quase frase a frase, fazendo o máximo aproveitamento dos tempos livres, depois de escrevermos para os familiares. Agora ele antecipou-se e fica-me a sensação de que o tempo se vai escoando.

Abraço de amizade
A. João Soares

A. João Soares disse...

Ao meu Pai, Professor Cardoso Escrito por Lisa Cardoso
04-Abr-2008
« Moldei as chaves do mundo a que outros chamaram seu, mas quem mergulhou no fundo do sonho, esse, fui eu.”

In António Gedeão, Poemas Escolhidos


Em 1973, noticiava a Voz do Mar, “homem novo, culto, espírito aberto e atento aos problemas do seu tempo”. A vice-presidência da Câmara Municipal de Peniche era confiada ao então Tenente Arceolindo Maria Cardoso.

Com o peso da responsabilidade na caneta, quero escrever estas palavras, porque o meu Pai o merece e porque a minha terra perdeu um Homem Bom.

Peniche, terra que ele adoptou e em que sempre acreditou, desde logo se habituou às suas ideias, sonhos e firmes convicções de um homem activo e interessado no desenvolvimento da terra em que vivia.

Quantos não saberão melhor do que eu, das discussões entusiastas, das batalhas sentidas e de um querer (que quem dera fosse o meu) que ele sempre demonstrou ao longo da vida.

Faça-se uma pausa, pois o seu silêncio continua a transmitir sabedoria.

“ Tiveste um Pai fantástico”, “ Um homem de cultura e boa disposição superiores” disseram-me …

Quantos irmãos não tenho, do Professor altruísta com os seus alunos, incansável em transmitir-lhes o conhecimento do que aprendera nos livros e na vida, porque o considerava fundamental para a formação integral da pessoa humana.

Viveu na solidariedade, no companheirismo e na compreensão do próximo, porque pouco mais faz sentido.

Pai, hoje choro com maior mágoa as desgraças do mundo, porque não foi esse o legado e o sentido que me fizeste ver na vida, mas como uma vez me disseste: Acreditem Sempre!

Quero por último, em meu nome e da minha família, agradecer a todos os amigos que estiveram presentes no seu funeral e aos que sei que queriam estar mas não puderam. Sinto que ele me deixou esta tarefa.

Só foi pena não termos tido o privilégio de ter mais uma conversa, para falar das coisas importantes da vida, do seu Sporting, ou então combinarmos o próximo petisco na companhia de uns amigos…

Ao Pai, ao Homem, ao Professor e ao Amigo

Um até sempre no meu coração!

Adicionar como favorito (0) | Cite este artigo no seu site | Visualizações: 306

Comentários (8)

"Um homem de cultura e boa disposição su
Escrito por Ângela Malheiros, às 10:05 em 08-04-2008
Só hoje tive a oportunidade de ler este artigo da Lisa e devo dizer que muito me sensibilizou por ter conseguido transmitir tão bem aquilo que o Professor Cardoso era.Tive felizmente essa oportunidade: a de o ter como professor, nos idos tempos do Colégio. Nunca lhe perdi o rasto e, mais recentemente, voltei a estar um pouco mais perto do seu saber e da sua presença companheira. Dele guardo a imagem que escolhi para dar título a este comentário...e pouco mais há a dizer, a não ser: até sempre, Prof. Cardoso.
Enviar alerta sobre este comentário
Homenagem
Escrito por Joana BarradasEste endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que o JavaScript terá de estar activado para que possa visualizar o endereço de email , às 11:16 em 07-04-2008
Aqui fica a homenagem que fiz no nosso blog de "amigas" ao homem, Pai e Professor...

Não sei o que é perder uma das pessoas que nos gerou, que nos acompanhou, que nos fez crescer, amadurecer, que alegrou os nossos choros e abrandou os nossos ritmos frenéticos de adolescente, que nos aconselhou nos rumos a seguir, que deu exemplos...só sei que deve ser muito duro. Sempre quereríamos mais um pouco na sua companhia, sempre quereríamos dizer mais uma palavra, fazer mais um gesto...
A morte faz parte da vida mas é tão difícil de compreender, não é? Já o sofrimento torna a morte um pouco mais compreensível e era em sofrimento que estava o Pai Cardoso. Gosto de pensar que, por esse motivo, ele foi em paz.
Deixo aqui a minha homenagem, porque além de ser sempre o Pai Cardoso, tb foi o "Stor Cardoso", um dos melhores que tive. Incansável na transmissão da cultura geral que acumulou ao longo da vida, alimentando o interesse dos despertos para perceberem que o conhecimento, a análise crítica, seriam valiosos para o nosso futuro.
Além disso, deixa na vida uma família de pessoas íntegras, completas como seres humanos, das quais tenho um enorme orgulho de me considerarem uma amiga...
Que os nossos Pais vivam sempre nos nossos corações, na nossa alma, seja em vida ou depois dela!
Enviar alerta sobre este comentário
Pesames
Escrito por Eduardo Sergio Ramos RibeiroEste endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que o JavaScript terá de estar activado para que possa visualizar o endereço de email , às 09:52 em 07-04-2008
Lisa, Gonçalo, Nuno, Vanda e Bilá.
Como escreves, queria ter estado presente mas não pude.
Os meus sentidos pesames.

e não há mais palavras...
Enviar alerta sobre este comentário
Recordar o Prof. Cardoso...
Escrito por Francisco FélixEste endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que o JavaScript terá de estar activado para que possa visualizar o endereço de email , às 18:59 em 06-04-2008
Fui aluno do Prof. Cardoso e recordo frequentemente algumas das suas magníficas histórias. Ainda não se falava em ambientes de aprendizagem e já o Prof. arranjava maneiras peculiares de transmitir o conhecimento. Mais tarde, leccionámos uma disciplina em comum num Curso de Formação Profissional; lembro-me particularmente do espírito com que encarava as diversas tarefas a desenvolver. Houve oportunidade de falarmos sobre o nosso Sporting e também sobre livros (outra faceta que retive dos tempos de estudante, o seu entusiasmo ao falar de Literatura).
Um abraço para toda a família.
Francisco Félix
Enviar alerta sobre este comentário
Sogro e Amigo
Escrito por CristinaEste endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que o JavaScript terá de estar activado para que possa visualizar o endereço de email , às 16:16 em 04-04-2008
Muito foi dito nesta carta acerca do meu sogro, contudo, muitos outros sentimentos ficarão para sempre connosco sem que encontremos palavras para o exprimir. Para muitos de nós ele foi sempre uma pessoa presente para apoiar e dar sugestões em todos os aspectos das nossas vidas. Não tendo eu família directa em Peniche, tive-o e terei sempre como referência para seguir o meu caminho com muitos precalços, não esquecendo,contudo, nem desvalorizando o meu querido Pai que também muito me apoia e serve de referência a partir da sua experiência pessoal, tal como o nosso querido amigo Cardoso.
Da amiga Cristina
Enviar alerta sobre este comentário
Escrito por Rita CoelhoEste endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que o JavaScript terá de estar activado para que possa visualizar o endereço de email , às 15:34 em 04-04-2008
Lisa, um beijinho especial para ti e para toda a tua família.
Não há conforto que se possa dar perante uma dor destas, no entanto, quero que saibas que estou aqui AMIGA...sempre que precisares!
Um beijinho
Rita
Enviar alerta sobre este comentário
Ao meu Pai, Professor Cardoso
Escrito por José Miguel NunesEste endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que o JavaScript terá de estar activado para que possa visualizar o endereço de email , às 11:58 em 04-04-2008
Tive o privilégio de ser aluno e amigo do Professor Cardoso. Não era professor por obrigação, era professor por vocação, e isso sentia-se no modo como dava as aulas e transmitia a matéria. Homem extremamente inteligente, tinha sempre uma maneira diferente de dar um conselho. Conseguia retirar de cada um de nós aquilo que de bom tínhamos e potenciá-lo.
Recordo com saudade os muitos jogos entre o meu Benfica e o seu Sporting que assisti na sua companhia, e o inevitável petisco que muito apreciava.
Sou hoje uma pessoa melhor pelo simples facto de ter tido a sorte do meu caminho se ter cruzado com o Professor Cardoso, e isso irá acompanhar-me até ao dia de eu também ter de partir.
A toda a família, o meu sentido conforto, em especial à esposa e filhos: Nuno, Vanda e Lisa. Ao Gonçalo um abraço muito especial.

Do amigo
José Miguel Nunes
Enviar alerta sobre este comentário
Escrito por TC, às 11:00 em 04-04-2008
Lisa, um grande abraço para ti e para a tua família, o meu também foi à menos de um ano, e custa muito despedir-nos da nossa referência...

Telmo