quarta-feira, 12 de março de 2008

Carta sensata de um professor competente

De um Professor indignado... porque competente!
Indignado... porque ama ensinar!
Indignado... porque se realiza no trabalho produzido com os alunos!
Indignado... porque procura preocupar-se com o essencial!
Por isso a publico.

From: Fernando Pena
To: cartasaodirector@sol.pt

Senhor Director,

Li há pouco que o Ministério da Educação decidiu acrecentar meia hora ao tempo de resolução do exame nacional de Matemática de 12º ano. A medida não é nova; já o ano passado se fizera o mesmo. Um destes dias os alunos que contem com farnel.

Curiosamente, ao acréscimo de tempo do ano passado não correspondeu qualquer aumento de tamanho ou dificuldade da prova. Pelo contrário, as questões eram simples (simplórias seria mais adequado) e ainda se retirou a penalização por resposta errada nas perguntas de escolha múltipla, abrindo-se a porta à lotaria dos ignorantes. Presumo que no presente ano a coisa não mude muito.

Temos, assim, uma nova operação de cosmética académica, em que a má preparação dos alunos é disfarçada por portaria. O que me parece bizarro é que os senhores professores da indignação assistam impassíveis à degradação recorrente do ensino. Gerações sucessivas de alunos têm sido aniquiladas pelo "eduquês", por modas pedagógicas criminosas, pelo laxismo, por programas imbecis, por uma escola que não ensina nem educa. Os donos da educação em Portugal têm cavado o abismo do nosso futuro, sem que os docentes saissem para a rua, cuidados que estavam das suas reduções de horário, da sua progressão por antiguidade, das suas folgas semanais, do seu absentismo justificado, das suas acções de formação inúteis, da sua função moderna de «facilitadores da aprendizagem».

Os resultados em Matemática repetem-se à saciedade: médias negativas nos exames nacionais, dificuldades extremas nas disciplinas universitárias, prestações muito insatisfatórias em estudos internacionais. Pode o Ministério superiormente mascarar o desastre com medidas avulsas de sucesso fabricado. Mas o essencial não muda, neste nosso modelo centralizado, dirigido pelo Estado, sem mudança nem esperança.

Sou professor num estabelecimento de ensino que lecciona o Bacharelato Internacional, curso secundário de reconhecido prestígio mundial. Olho de relance, no final desta carta, para os livros de texto dos meus alunos. Quase um milhar de páginas sóbrias e sérias, sem puerilidade nem diversão. A solução está aqui tão próxima: currículos exigentes, avaliação rigorosa, esforço, estudo, mérito. De alunos e professores.

Num país em liquidação, como é que se enche as ruas por um prato de lentilhas?

Fernando Pena

4 comentários:

Amaral disse...

João
Em parte concordo com a carta. Sem dúvida que em muitos aspectos fala verdade, mas não se pode tomar a floresta pela árvore.
Os alunos se não sabem é porque os POLÍTICOS ditam leis de facilitismo e os professores têm de as cumprir.
Concordo que a exigência seja para ambos e não só para os professores. Nenhum professor, a menos que seja imcompetente (infelizmente há alguns como em todas as profissões) teme a avaliação; aqui o que está em causa é o modelo, a metodologia e o timming da aplicação.
Abraço

A. João Soares disse...

Amaral,
Concordo com as suas palavras sensatas e cuidadosas, ressalvando algumas excepções, na competência generalizada dos professores. Pessoalmente, considero-os uma classe de prestígio que merece respeito e consideração, o que aliás numa sondagem de há poucas semanas era confirmado.
Abraço
João

Mariazita disse...

Caro João
O teor desta carta realça o que é já conhecido de todos: a operação de cosmética.

Vejamos o que se passa com os cursos profissionais (até ao passado ano chamados “tecnológicos”)

Estes cursos são ministrados a alunos que até ao 9º.ano não obtiveram resultados satisfatórios , e não têm, portanto, capacidade para seguir os estudos que lhes dariam acesso à Universidade. Muito louvável! O país já tem doutores a mais…

O que se passa de errado?

Estes alunos são forçosamente pouco bons, no mínimo. Os cursos são ministrados por módulos, não por disciplinas, sendo que, a cada ano, é atribuído um determinado número de módulos.

Na prática resulta que, quando termina um período escolar, não significa que tenha terminado um módulo. Do mesmo modo, quando termina o ano lectivo, os módulos atribuídos a esse ano, podem ainda não ter sido completados.
E assim, o professor continuará a dar aulas, mesmo durante as férias, até que TODOS os alunos tenham completado TODOS os módulos desse ano, e assim possam transitar para o ano seguinte.

Por outro lado, a um aluno que falte a um teste é dada a oportunidade de o fazer noutra data, ou ainda noutra… tantas quantas as necessárias para o realizar. O que está fora de causa é um aluno chumbar! Saiba ou não saiba (e normalmente não sabe) tem que ser aprovado!

Também nos outros cursos (cientifico-naturais, por exemplo), se um aluno estiver chumbado por faltas, (o que anteriormente podia acontecer) é-lhe feito um teste especial, com vista a passá-lo de ano.

Onde pára a moralidade? Ao aluno que durante o ano se baldou às aulas, que teria o ano perdido por faltas, dá-se-lhe um prato de arroz doce – um teste para “oficializar” a sua passagem de ano!
Basta-lhe ser um pouco esperto, preparar-se para o teste (que não vai ser difícil, não vá o menino espalhar-se e precisar de fazer outro até acertar), e tem o ano garantido.
Os outros, os parvos que andaram um ano inteiro a queimar as pestanas, devem sentir-se lindamente com estas situações!

Tudo isto ao abrigo do Novo Estatuto do Aluno.

Tudo isto em prol da “operação de cosmética”.

Como se fossem trabalhados no Photoshop, alunos medíocres, que irão dar lugar a péssimos profissionais, aparecem com resultados excelentes.

E assim, o sucesso escolar é… um sucesso!

Desculpe, meu amigo, se me alonguei demasiado... é que sou avó de 9 netos em edidade escolar ( = 9 alunos ) e estes assuntos "mexem" comigo.
Beijinhos
Mariazita


O blog neófito A casa da Mariquinhas agradece a sua visita e comentário.

A. João Soares disse...

Cara Mariazita,
Gostei deste d«seu comentário muito bem explicado por quem conhece muito bem o problema.
Espero que a ministra e os seus colaboradores mais directos tenham humildade de reconhecer que o problema não é só deles mas do País e que para encontrar uma boa solução esta tem de ser procurada e aceite pelos professores, com a colaboração destes e NÃO CONTRA ESTES.
cumprimentos ao seu marido e beijos de amizade
João