Hoje almocei num café que serve almoços, no bairro do Rosário em Cascais. Perto da mesa em que fiquei, estava na parede um placar em que ocupava muito espaço um papel equivalente a duas folhas A4 com letra miúda. No cimo tinha a indicação da origem «Gabinete Jurídico», certamente a instituição estaria indicada no verso. Por baixo dessa indicação, lia-se o assunto: «Lei do tabaco».
O que era visível era a reprodução dos dois autocolantes muito conhecidos Não Fumadores, a vermelho; e Fumadores, a azul.
Interroguei-me sobre a intenção do lunático que gastou o nosso dinheiro a produzir e distribuir tal papel. Com aquela extensão e o tipo e tamanho da letra, pensei que poucas pessoas o leriam. Conversando com outras pessoas que ali estavam, fiquei a saber que não estou isolado naqueles que não o leram nem tencionam lê-lo. Para quê, estar ali a gastar a vista tanto tempo para ler tantas especificidades inúteis que apenas deram gozo masturbatório intelectual ao seu autor. São assim os nossos políticos!
Faz-me lembrar a confusa e extensa lei das armas que, se era para reduzir a violência armada, ficou muito longe desse objectivo, evidenciando a sua inutilidade.
Já em Janeiro de 2003 me referi a esta diarreia legislativa sem sentido nem nexo na carta que transcrevo a seguir
A utopia dos nossos políticos
(16 de Janeiro de 2003)
Um conhecido deputado afirmou, em 16 de Janeiro, depois de ter recebido dois antigos alunos da Casa Pia, que ia propor o aumento das penas para os casos de pedofilia. Embora, à primeira vista, isto pareça uma medida muito salutar, não passa, na realidade, de uma boa intenção, de pios propósitos, mas utópica e insuficiente, como infelizmente tem acontecido em muitos casos semelhantes. Os políticos, perante um problema, fazem uma lei e... vão dormir descansados. Mas, quase sempre, tudo vai continuar na mesma.
Com efeito, o aumento das penas só será aplicável aos casos levados a julgamento, e não aos restantes. Para estes, nada conta, nem pequenas nem grandes penas. Veja-se, o que é feito do embaixador Ritto? E os outros quem são? Por onde andam?
Passa-se o mesmo com o aumento de penas para as infracções rodoviárias. De todos os que conduzem sem carta, sem seguro, sem documentos, com álcool a mais, com velocidade excessiva, etc. quantos são detectados? Apenas uma pequena amostra. Para os muitos que não são apanhados pela rede da fiscalização, não interessam as penas pequenas ou grandes. E o resultado traduz-se na continuação da sinistralidade rodoviária!! Teria mais efeito do que as grandes penas, que fosse aumentada a probabilidade de o infractor ser apanhado pela fiscalização, mesmo que a pena não fosse muito alta.
Na América está a ser julgado um menor como se já fosse adulto. Foi interpretado que a inimputabilidade a menores pressupõe crimes devidos à imaturidade física e psíquica do criminoso menor; não se aplica a crimes de cariz adulto, com preparação, organização, planeamento e execução, próprias de adultos experientes e de consciência endurecida. Recordo o caso de dois menores que fugiram de uma casa de rapazes na região de Elvas e foram roubar uma viatura na cidade da Guarda, percorreram o IP5, entraram na A1, tiveram um acidente, roubaram outro carro, continuaram, passaram à A6 e acabaram por ser detidos no Alentejo. Enfim, um crime de pessoa experiente, estruturada, com conhecimentos técnicos e consciente daquilo que queria. Estes indivíduos devem ser julgados como adultos ou como menores?
Enfim, a nossa legislação precisa de ser ponderada por alguém que tenha a preocupação de olhar para a realidade com olhos de ver e não apenas, através do postigo estreito das normas idealistas do direito.
A China tem nas cúpulas políticas, indivíduos com formação técnica e tecnológica, com diplomas de engenheiro, e não manipuladores das palavras. Talvez por isso, tem tido, na última década, taxas de crescimento do rendimento nacional da ordem dos 10 por cento. E nós?
A. João Soares
DELITO há dez anos
Há 1 hora
2 comentários:
Hoje comprei uma revista que não conhecia e entre aquilo que encontrei, no seu interior, centrei-me numa entrevista do advogado e antigo secretário de Estado, Ricardo Sá Fernandes. Nessa entrevista o advogado destacou precisamente a Justiça Portuguesa e o seu funcionamento. Parte do que foca nesta sua postagem pode-se entender naquela entrevista. Em minha opinião acho que em Portugal vai-se ao circular mas nunca ao essencial.
Um abraço
António Delgado
Ps. Voltei a comentar porque não sei o que se passou com um outro que à pouco deixei.
Caro António Delgado,
Já visitei e comentei no seu «Ecos e Comentários» e vou transcrever o seu post para aqui, porque é uma opinião de referência, de uma pessoa insuspeita, por já ter pertencido a um governo PS.
Abraço
A. João Soares
Enviar um comentário