terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Imagem de um conselheiro de Estado

Em 22 de Novembro foi abordado este tema no post «Sobre o perfil de um ex-ministro», com traços pouco definidos mas, entretanto, têm surgido na Comunicação Social mais dados e, hoje, o artigo de opinião que a seguir se transcreve apresenta um retrato mais sugestivo. Depois daquilo que o Sr. Conselheiro declarou na entrevista a que se prestou ou que solicitou, em que disse ter assinado papéis sem os ler, por nada saber de contabilidade, é estranho que, após ter sido recebido pelo Sr Presidente da República, tenha «garantido» que não cometeu nada errado, nenhum acto delituoso. Fica a dúvida de como é que ele sabe isso? Como é que pode garantir que ao assinar papéis que não leu, não fez nada errado, ou não foi inconscientemente conivente nos maiores erros praticados na empresa?

Vejamos o que diz o artigo:

A LÓGICA CONSPIRA CONTRA DIAS LOUREIRO


João Miguel Tavares, Jornalista - jmtavares@dn.pt

Depois de uma audiência com Dias Loureiro, o Presidente da República declarou aos jornalistas que o seu ex-ministro, apoiante, amigo e actual conselheiro de Estado lhe garantiu "solenemente que não cometeu qualquer irregularidade nas funções que desempenhou" enquanto administrador da Sociedade Lusa de Negócios, detentora do BPN. Mas nem isso nem o seu extenso comunicado autojustificativo acalmaram as conversas - e as notícias - quanto ao papel de Dias Loureiro em todo o processo. Não por qualquer devaneio conspirativo ou prazer obscuro em sujar o nosso imaculado Presidente, receio bem, mas porque duas ou três gotas de perfume não conseguem disfarçar o desagradável odor que este caso liberta. É que, para haver uma solene inocência de Dias Loureiro, seria necessário que:

1) Ele fosse solenemente incompetente. Apesar de o próprio se gabar do seu talento para os negócios, que lhe permitiram enriquecer em meia dúzia de anos, Dias Loureiro teria de ser um miserável gestor: à frente da SLN, não topou nada do que se passava abaixo dele e permitiu que um banco sob a sua tutela fosse alegremente gerido sem reuniões da administração.

2) Ele fosse solenemente crédulo. O ex-ministro da Administração Interna que mandou nas polícias com mão de ferro teria afinal de ser uma alma sensível e facilmente manipulável. Depois de patrocinar um negócio ruinoso envolvendo offshores em Porto Rico, Dias Loureiro perguntou onde estavam os prejuízos nas contas do banco e Oliveira e Costa respondeu-lhe "você não percebe nada de contabilidade". Justificação prontamente aceite.

3) Ele fosse solenemente ingénuo. Dias Loureiro foi bater à porta do Banco de Portugal pedindo-lhe "uma atenção especial ao BPN". É certo que o seu interlocutor já o veio desmentir. Mas admitamos a boa-fé de Dias Loureiro: seria o mesmo que Luís Filipe Vieira ir pedir à Liga de Clubes para vigiar com especial atenção a equipa do Benfica.

4) Ele fosse solenemente esquecido. Convém recordar a primeira declaração de Dias Loureiro a propósito deste caso, a 3 de Novembro: "Nunca tive conhecimento de problemas relacionados com o BPN. Tudo o que sei é o que leio nos jornais." Difícil de conjugar com o ponto 3.

5) E, por fim, ao mesmo tempo que era solenemente incompetente, solenemente crédulo, solenemente ingénuo e solenemente esquecido, teria também de ser solenemente inteligente - porque, quando o caso BPN explodiu Dias Loureiro, já tinha saído e levado consigo todo o dinheiro que havia investido no banco.

Como se vê, o problema de Cavaco e Dias Loureiro não são os golpes baixos nem as conspirações políticas. O problema é mesmo a maldita lógica que Aristóteles inventou.

Outros títulos dos jornais de hoje sobre o tema:

O primeiro milhão de Dias Loureiro
Expurgo faz "novas vítimas" no BPN

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