quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

O coveiro e o covil

Transcrição do post com o mesmo título publicado hoje no blog «A Revolta das Palavras»

Não resisto!
Chegou por várias fontes.
Circulará já na Net.

Mas aqui vai!

No aviso nº 11 466/2008 (2ª Série), declara-se aberto concurso no I.P.J. para um cargo de assessor, cujo vencimento anda à roda de 3500 euros. Na alínea 7 do dito aviso consigna-se que o método de selecção a utilizar é o concurso de prova pública que consiste na apreciação e discussão do currículo profissional do candidato.

Pois bem.

No aviso da pág. 26922, oriundo da Câmara Municipal de Lisboa anuncia-se concurso externo de ingresso para coveiro, cujo vencimento anda à roda de 450 euros mensais.
Ora o método de selecção neste caso é outro.

Primeiro, prova de conhecimentos globais de natureza teórica e escrita com a duração de 90 minutos. A prova consiste no seguinte:
1. - Direitos e Deveres da Função Pública e Deontologia Profissional;
2. - Regime de Férias, Faltas e Licenças;
3. - Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos.
Depois vem a prova de conhecimentos técnicos: Inumações, cremações, exumações, trasladações, ossários, jazigos, columbários ou cendrários. Além disso, claro, conhecimentos de transporte e remoção de restos mortais.
No final, exame médico para aferimento das capacidades físicas e psíquicas do candidato, não vá, claro, os mortos candidatarem-se.

Bem se ria o falecido Fernando Luso Soares num dos seus livros o Vontade de Ser Ministro, quando fantasiava, no quadro do antigo regime, com a história de um candidato a cargo por perbenda das senhoras autoridades e figuras gradas, que, ansioso por ser ministro, se viu convencido de que o lugar de inspector dos cemitérios era, na outra senhora, um dos lugares de maior importância política, sabido que os empedernidos e pertinazes reviralhiastas não perdiam pitada para armar motim no Alto de São João com discursatas republicanas, nos Prazeres com efemérides democráticas e por onde calhavam a pretexto de sepulcro lançar a simbólica de ornamentações amaçonadas e aventaleiras, que isto a pedreiragem, ademais jacobina e anti-talassa, tem artes de dianho.

Publicada por José António Barreiros

NOTA: Até parece uma anedota ou a confirmação das palavras de uma vereadora da CML que, quando houve celeuma sobre a quantidade de assessores, disse que estes não são nomeados pela sua competência mas por critério de confiança política. Realmente, se todos os assessores fossem competentes, teriam sido evitados os erros das decisões e os consequentes recuos, que ocorrem com muita frequência. Para apenas se analisar o currículo, talvez bastasse apresentar o cartão do partido! Difícil é ser coveiro, por precisar de muitos conhecimentos e competências, embora ganhe cerca de 8 vezes menos do que o assessor.

6 comentários:

Daniel Santos disse...

ser-se coveiro implica saber mais que um assessor, espectáculo.

A. João Soares disse...

Caro Daniel Santos,
É mesmo isso. Se havia dúvidas, elas desapareceram. O lugar de assessor é um pretexto para dar ordenado e ajudar um amigo a fazer carreira na política. dali, pode ir para deputado, secretário de Estado autarca, ministro, primeiro ministro, e os subsequentes «tachos dourados». Os jovens com qualidades, que são bons estudantes, não se metem na política para não se misturarem com tal gente.
Abraço
João

Luísa disse...

Acreditem infelizmente, isto é só um exmplo do que realamente se passa no país real.Casos desses vagueiam por todo o lado, e ficam impunes até aos comentários de quem olha e vê!

A. João Soares disse...

Cara Luísa
Isto não é um País, organizado e coerente. É uma manta de retalhos em que cada retalho se ornamenta a seu gosto. Não há rei nem roque.
Com estas e outras, tenho que, como fez Eça de Queirós, elogiar os emigrantes e reconhecer neles o valor, a iniciativa, a criatividade de sair deste pântano e fazer vida num País a sério.
Beijos
João

Ana disse...

Caro João:
Este texto está uma delícia.
O país, que tanto aprecia programas de anedotas na televisão, está transformado, ele próprio, numa enorme e confrangedora anedota.
E como para baixo é que é o caminho, lá continuamos, cada vez mais a descer, mormente na forma como o Estado se comporta.

Abraço

A. João Soares disse...

Cara Ana,
O aspecto que mais me choca é a PROPORCIONALIDADE INVERSA entre as condições exigidas e o salário. Paga-se a um ignorante cerca de(oito) vezes mais do que a um indivíduo a quem é exigida uma variedade de conhecimentos que dão para uma licenciatura na Independente!!! ou mais!!!
Mas, se não fosse um Pais que se afunda na desorganização e na corrupção, até era uma anedota para rir à gargalhada.
Um abraço
João