quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Como chegámos aqui?

Quatro anos repletos de casos com jornalistas
DN. 090923. por MARINA MARQUES

Episódios como o da suspensão do 'Jornal Nacional de 6.ª Feira' são interpretados como a face visível das pressões do Governo sobre a comunicação social ao longo dos últimos quatro anos. Num mandato marcado pelas polémicas alterações ao Estatuto do Jornalista, pelo falhanço no lançamento do 5.º canal e ainda pelo veto presidencial à lei do pluralismo e da não concentração dos media.

"Em nenhum dos governos do pós-25 de Abril houve uma relação tão acintosa entre um primeiro-ministro e os jornalistas." A afirmação é de Francisco Rui Cádima, professor da Universidade Nova de Lisboa, e junta-se a várias vozes que têm criticado publicamente a actuação deste Governo na área da comunicação social. Num balanço da legislatura, Francisco Pinto Balsemão, presidente da Impresa, falou esta semana em "estratégia [do Executivo] de debilitar e enfraquecer os grupos privados" e classificou Augusto Santos Silva como "o pior ministro que houve desde o 25 de Abril". As alterações ao Estatuto do Jornalista, os poderes concedidos à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), a lei da concentração - vetada por Cavaco Silva - e o concurso do 5.º canal são alguns dos momentos críticos.

A estas questões gerais, juntam--se alguns casos concretos, nomeadamente o chamado caso TVI. José Sócrates, no Congresso do PS, em Espinho, no final de Fevereiro, falou numa campanha negra da comunicação social contra si, dando o exemplo concreto do Jornal Nacional de 6.ª Feira, da TVI, apresentado por Manuela Moura Guedes, ao qual voltou mais tarde na entrevista a Judite Sousa, na RTP. E referiu ainda "um director de um jornal", numa referência ao Público - que neste momento está no centro do mais recente episódio político, o caso das escutas de Belém.

Pelo meio ficou ainda por clarificar o que se passou em relação à compra de 30% da Media Capital, proprietária da TVI, por parte da PT. Se num primeiro momento, perante as acusações da oposição de que o Governo, através da golden share que detém na empresa de telecomunicações, estava a mandar calar o TVI, o primeiro-ministro disse não comentar o negócio privado, no dia seguinte fez saber que o Governo iria utilizar o poder de veto para travar a compra para afastar quaisquer suspeitas.

Só que, pouco mais de dois meses depois, o anúncio da suspensão do Jornal Nacional de 6.ª Feira, a dois dias do seu regresso à antena - uma decisão da administração espanhola da empresa, muito próxima do PSOE -, caiu que nem uma bomba, já em plena pré-campanha. Sócrates apressou-se a dizer que nem ele nem o Governo tinham tido a ver com a decisão, mas não evitou ficar colado ao caso.

Referindo ainda as pressões sobre outros órgãos e sobre os jornalistas, com as alterações aprovadas ao Estatuto do Jornalista, Francisco Rui Cádima considera que "desta legislatura fica um rasto de interferência e ingerência do Governo nos meios de comunicação social". Por isso considera que o Estatuto deveria ser corrigido, nomeadamente quanto aos direitos de autor e à protecção das fontes, e que a Entidade Reguladora para a Comunicação Social "precisa de uma clarificação em relação aos poderes políticos e aos regulados".

Apesar da reformulação do contrato do serviço público realizado durante esta legislatura, o professor da Universidade Nova de Lisboa considera que "a sua independência face ao poder político ainda não está assegurada". Felisbela Lopes, professora da Universidade do Minho, adianta uma medida em concreto nesse sentido: "A nomeação do presidente do Conselho de Administração da RTP deve deixar de ser feita pelo Governo."

NOTA: Se os jornalistas se podem queixar de hostilidade, convém também recordar como foram tratados, os juízes, professores, médicos, enfermeiros, farmacêuticos, agricultores, PMEs, militares, polícias, etc ? É certo que o Governo prometeu reformas que já deviam ter sido feitas, mas orientou indevidamente a concretização, impondo as reformas contra os funcionários dos sectores em vez de apelar à sua boa vontade e colaboração de forma construtiva. Quis reformar contra e não com a cooperação dos mais interessados. Os portugueses de variados sectores têm sido muito mal tratados em benefício das ambições dos políticos, desde há algumas décadas.

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