As Farpas - Ramalho Ortigão - 1882
"Trocadas as descomposturas preliminares, sobre a questão da fazenda, decide-se que é indispensável, ainda mais uma vez, recorrer ao crédito, e faz-se novo empréstimo.
No dia seguinte averigua-se, por cálculos cheios de engenho aritmético que para pagar os encargos do empréstimo do ano anterior não há outro remédio senão recorrer ainda mais uma vez ao país e cria-se um novo imposto.
Fazem-se empréstimos para suprir o imposto, criam-se impostos para pagar os empréstimos, tornam-se a fazer empréstimos para atalhar os desvios do imposto para o pagamento dos juros, e neste interessante círculo vicioso, mas ingénuo, o deficit - por uma estranha birra, admissível num ser teimoso, mas inexplicável num mero saldo negativo, em uma não-existência - aumenta sempre através das contribuições intermitentes com que se destinam a extingui-lo, já o empréstimo contraído, já o imposto cobrado.
Pela parte que lhe respeita, o país espera.
O quê?
O momento em que pela boa razão de não haver mais coisa que se colecte, porque está colectado tudo, deixe de haver quem empreste, por não haver mais quem pague..."
NOTA: Apesar de tudo, por inexplicável milagre, conseguimos sobreviver até 2010 !!!
Da série: O remorso do algoz
Há 1 hora
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