terça-feira, 4 de maio de 2010

Crise convicção ou teimosia

Transcreve-se o artigo de Alberto Castro, porque traz pontos de reflexão sobre a situação actual. A fronteira entre separação entre «convicção e teimosia» não me parece correcta, porque tratando-se de duas atitudes do âmbito da emotividade, não garantem resultados racionais, justificáveis perante os que possam ser beneficiados ou prejudicados pelas decisões tomadas ao arrepio da racionalidade. Os realces de algumas frases são de minha opção.

Agora é que vai ser?
Jornal de Notícias. 04-05-2010. Por Alberto Castro

Passos Coelho surpreendeu ao tomar a iniciativa da reunião com o Primeiro-Ministro (PM), permitindo apresentar ao exterior uma imagem de unidade na determinação para enfrentar os desafios que se nos colocam. O país agradece. O encontro teve consequências imediatas. Anteciparam-se algumas medidas que permitirão reduzir a despesa ou, pelo menos, controlar o seu crescimento. É um começo.

Talvez sejam poucas. Sobretudo porque a nossa "concorrência" não esteve parada. Por imposição externa, os gregos, por iniciativa própria, os espanhóis, a verdade é que ambos tomaram medidas muito duras para disciplinar as contas públicas. E depois? A velocidade a que estamos a correr até pode dar para cortarmos a meta no tempo que nos propusemos. Só que, se os outros correrem mais depressa, é inevitável que façamos a figura do coxo (sem ofensa!) da anedota: por mais que clamemos por um tratamento equitativo, seremos vítimas de um dos leões deste mundo (FMI ou outro qualquer). Nestas circunstâncias, não nos interessa ter o protagonismo por ficarmos para trás. Já que não vamos à frente, mantenhamo-nos no meio do pelotão. O que obriga a estugar o passo.

Mal se percebe, por isso, a insistência na manutenção do calendário dos grandes investimentos públicos. Talvez se possa louvar a convicção. Só que quando tantos, cá dentro e lá fora, colocam reticências, há uma fronteira estreita entre convicção e teimosia, pressa e precipitação.

Vivemos com o mito de que nos falta investimento, sobretudo em grandes projectos. Que nos falta um grande centro, a partir do qual irradiariam efeitos positivos para todo o resto do país. Vai-se a ver e conclui-se que não investimos pouco. Investimos mal. E que a centralização apenas acentuou diferenças. Será que é agora, com estes investimentos, que tudo se vai alterar? O PM argumenta estar já tudo mais do que estudado e que os méritos são evidentes. Só falta mesmo decidir. Pouco interessam as drásticas alterações no contexto. Ou o facto de haver técnicos competentes, muitos sem filiação partidária nem ligações a grupos económicos, que defendem posições distintas que vão do adiamento à anulação pura e simples. Não é preciso. Os estudos são inequívocos. Os argumentos sólidos. Como o do Ministro das Obras Públicas que justificou a construção do novo aeroporto de Lisboa por a Portela não ter tido capacidade para acolher todos os pedidos de utilização do aeroporto durante a erupção do vulcão islandês! O que, como sabemos, ocorre regularmente… E não há outros aeroportos! Mário Lino está perdoado!

Por isso, senhor primeiro-ministro, ganharia se ouvisse e ponderasse outras opiniões. Olhe à sua volta, para os outros países e para quem está com um olho em nós. Como verão a sua determinação? Depois, decida. E esclareça. Não escamoteie os prós e os contras da decisão - há sempre prós e contras - e a forma como os ponderou. Ninguém lhe levará a mal se mudar de opinião. Não ter dúvidas é mais de meio caminho andado para estar errado.

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