Transcrição do blog O Povo, por ser oportuno e muito esclarecedor:
Abstenção: não
Público 2011-05-27 Luís Campos e Cunha, professor universitário
A abstenção não faz qualquer pressão para os partidos se abrirem e reformarem, nem incentiva novas alternativas de voto.
Não votar, abstendo-se, ou votar branco (ou nulo) são atitudes radicalmente diferentes. São idênticas do ponto de vista legal, mas politicamente muito diferentes. E estas eleições são as eleições mais importantes desde as eleições para a Assembleia Constituinte em 1975. Portanto, cuidado.
Em eleições, a abstenção tem pouco significado político. Tem aumentado como sabemos, donde se conclui uma vaga insatisfação com o sistema político-partidário que nos rege. Como tem um significado ambíguo, os partidos pouco se incomodam com o aumento da abstenção e apenas choram cínicas lágrimas de crocodilo. É tudo e é pouco.
De facto, mais uma pessoa a abster-se pode ser muita coisa: o sujeito morreu, mudou de residência, o eleitor está com uma amigdalite, está descrente na política, foi à praia, ou ainda os cadernos eleitorais estão desactualizados. Pode ainda ser um sujeito que não acredita na democracia ou, simplesmente, nesta democracia. Nunca saberemos.
Politicamente a abstenção não tem, de facto, muito significado, por muito elevada que seja. Além disso, para qualquer partido perder um voto para a abstenção é meia vitória: menos um que não vai votar no partido concorrente e menos um sujeito com quem se preocuparem. Ou seja, a abstenção não faz qualquer pressão para os partidos se abrirem e reformarem, nem incentiva a que apareçam novas alternativas de voto, ou seja, novos partidos. Por isso, abster-se é pouco inteligente.
A democracia e a liberdade assentam nos partidos. A democracia não se esgota nos partidos, mas estes são os pilares do sistema. E todos temos a sensação que algo vai muito mal nos partidos existentes (uns mais do que outros, naturalmente). Falta credibilidade à classe política e partidária e falta interesse por parte dos mais jovens em participarem politicamente nos partidos existentes. Portanto, a renovação da classe política não se faz, e quando se faz é muitas vezes para pior. O fenómeno não é exclusivo de Portugal, mas é particularmente agudo no nosso caso.
As instituições, como as universidades, os hospitais públicos ou os partidos políticos (e contrariamente às empresas em concorrência) não se auto-reformam. No caso dos partidos, é necessário que haja pressão da opinião pública de forma clara e, eventualmente, organizada para os partidos mudarem e para aparecerem mais alternativas. Como?
Como vimos a abstenção não coloca essa pressão nos partidos. Em certo sentido até reduz; é menos um cidadão a chatear. Mas o voto nulo/branco é bem diferente. Quem vota nulo não morreu, não foi à praia, não mudou de residência, não se borrifou , gosta da democracia e exerceu o seu direito e o seu dever de cidadania. Pelo contrário, não tendo morrido, não foi à praia para ir votar branco. Votando branco/nulo foi dizer, de forma muito clara, que gostaria de ter votado num partido, mas que nenhum satisfaz as suas exigências mínimas para lhe dar a confiança de governar. Por isso, votar branco/nulo é, politicamente, tanto ou mais significativo que votar num partido. É votar contra todos os que se apresentam a votos. É portanto muito diferente da abstenção, como fica claro.
Como cidadãos o nosso dever é, antes de mais, votar. Segundo, devemos procurar conscientemente votar num partido. Se, em terceiro lugar, nenhum partido satisfaz, devemos votar branco/nulo.
Os brancos e nulos têm vindo a aumentar, mas continuam a ser um pequeno resto a que não se dá importância. Mas imagine-se que os votos brancos e nulos passam a 10% dos votos expressos! Isto, legalmente, não teria impacto, mas politicamente seria uma pedrada no charco pantanoso em que o país se vem atolando. Nenhum partido ignoraria que 10% dos votantes estão desejosos de conseguir votar nalgum partido digno de os representar. Podem ser os partidos actuais, para o que se teriam de renovar, ou um hipotético novo partido, o que obrigaria os actuais a renovar-se. O resultado de 10% de votos brancos seria o mesmo: um valente susto na classe partidária instalada, num poder a que só os actuais têm acesso.
Para que não fique a ideia de que defendo o voto branco ou nulo em substituição de uma escolha partidária, faço notar que esta eleição é um verdadeiro referendo a Sócrates, que nos levou à bancarrota e à mendicidade internacional. Como Carlos Fiolhais defendeu, a democracia também serve para afastar os que não servem: e Sócrates não serviu nem vai servir. "Se a escolha em Portugal fosse, por hipótese, entre o actual primeiro-ministro e o Rato Mickey, eu não hesitaria em votar no boneco da Disney." Defendo o voto branco ou nulo como alternativa ética e política à abstenção.
Assim, ou votamos branco-nulo, ou votamos num dos partidos actuais: essa é a escolha. Abster-se é um erro grave e sinal de fraca inteligência. É a última esperança de um cidadão consciente. Mais tarde reivindicaremos que o voto branco tenha representação parlamentar com uma cadeira vazia. E nessa altura veremos a abstenção a baixar e muito. Também porque a partir daí os partidos actuais seriam diferentes e para melhor.
Professor universitário
Imagem do Google
Duplo critério
Há 2 horas
4 comentários:
Aquando das presidenciais, publiquei um texto no meu blog a defender o mesmo.
http://reinoscombatentes.blogspot.com/2011/01/votar-e-um-direito-e-um-dever.html
Caro Amigo,
Visitei e comentei o seu post. Há muita semelhança entre este post e o seu. Deixam bem clara a importância do voto em branco, como boa substituição da abstenção. Nas últimas legislativas os votos brancos foram em número superior aos do MRPP e este foi acima do mínimo para ter financiamento das despesas da campanha. Mas houve uma grande diferença: o voto branco não teve campanha, foi espontâneo dos eleitores pensantes que por ele optaram.
Veremos nas próximas...
Abraço
João
Caro João Soares
Concordo inteiramente.
Mas penso que vivemos um momento crucial em que urge acima de tudo afastar defenitivamente da política portuguesa o cidadão Pinto de Sousa.
Nesses termos, decidi votar na candidatura que mais contribua para esse objectivo.
Caro Vouga,
Realmente estamos num momento crucial.
Como o professor Campos e Cunha diz «esta eleição é um verdadeiro referendo a Sócrates, que nos levou à bancarrota e à mendicidade internacional. Como Carlos Fiolhais defendeu, a democracia também serve para afastar os que não servem: e Sócrates não serviu nem vai servir. "Se a escolha em Portugal fosse, por hipótese, entre o actual primeiro-ministro e o Rato Mickey, eu não hesitaria em votar no boneco da Disney."».
É realmente «um momento crucial» como o Vouga diz.
O voto em branco é aconselhável a quem é tentado a abster-se e não aos que têm a sua decisão tomada, seja por motivos construtivos ou para exclusão do indesejável. Há também quem não goste de votar no menos mau, mas queira passar a «procuração com plenos direitos», o voto, a aprovação apenas a pessoas de muita confiança. É pena que Passos Coelho ainda não tenha anunciado o que fará aos sorvedouros de dinheiro público referidos em 07-10-2010 em Marques Mendes apresenta lista com dezenas de institutos públicos que podem ser extintos.
A campanha está num nível muito baixo de hostilidades pessoais e muito alheia aos interesses nacionais. Por outro lado, o eleitor não conhece os elementos das listas, pelo que pode recear estar a dar o aval a indivíduos de má formação ética e patriótica, como o «gamador» de gravadores e outros de má nota.
Neste caso, como diz Campos e Cunha, é aceitável votar no Rato Mickey se ele for candidato rival do José Sousa.
Um abraço
João
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