sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

GRANIZO, UM RISCO DA NATUREZA

(Public em DIABO nº 2303 de19-02-2021, pág 16. Por António João Soares

Cada actividade tem os seus riscos e deve saber viver com eles, procurando reduzir os incómodos. Vivi os meus primeiros 18 anos na proximidade da agricultura e cedo aprendi como acontecem fenómenos naturais e os seus efeitos desagradáveis. O granizo forma-se pelo movimento vertical das nuvens; subindo estas para altitudes gélidas, a humidade congela, torna-se mais densa do que o ar e despenha-se em grãos ou pedras de granizo ou saraiva que podem ir de tamanho de poucos milímetros de diâmetro a pedras de 20 cm que, ao caírem, provocam estragos consideráveis em telhados, automóveis ou aviões e na agricultura e fruticultura. As pedras maiores podem atingir grande velocidade na queda, sendo altamente destrutivas.

Há pouco, li a notícia de que 12 deputados preparam o texto de uma resolução da AR com o pedido ao Governo de apoio para a instalação de sistemas anti-granizo e tornar mais resiliente o sector da fruticultura face a tais fenómenos atmosféricos. Não havia no texto nada que esclarecesse sobre tais sistemas, mas presumi que se tratava de fazer cobertos que conseguissem que as pedras fossem paradas antes de estragarem a fruta. Como não havia referência a opinião de técnicos, pareceu-me uma ideia imatura defender a cultura de fruta em recintos fechados para não haver acesso do granizo. Tal fruta, sem sol nem outros efeitos atmosféricos, seria intragável.

Como fazer a prevenção, em tempo útil? Na Idade Média, em aldeias da Europa, pessoas tocavam os sinos nas igrejas e davam tiros de canhão para alertar a população da aproximação de uma tempestade de granizo. Depois da Segunda Guerra Mundial, a Rússia passou a usar o método da semeadura de nuvens para afastar e eliminar a ameaça de granizo, e chegou a anunciar uma redução de 50 a 80% nos danos em colheitas provocados por granizo, aplicando iodeto de prata através de foguetes e obus de artilharia. Mas esses resultados não foram verificados. Mais tarde houve programas de supressão de granizo empreendidos em 15 países entre 1965 e 2005. Porém, até o momento, nenhum método de prevenção se provou eficaz.

Parece não ser possível garantir com uma antecedência útil para se proceder a cuidados de defesa de áreas em perigo. Os meteorologistas usam diversos tipos de radares que identificam se o conteúdo de uma nuvem é água ou se é granizo, mas essas observações exigem cálculos complexos de algo que pode acontecer dentro de poucos segundos ou minutos, portanto sem dar tempo para serem tomadas medidas de protecção.

Perante a complexidade deste fenómeno natural, parece positiva esta preocupação dos 12 deputados, mas será conveniente que dialoguem serenamente com cientistas da meteorologia antes de lançarem o Governo em actividades sem saber o que estão a fazer, o que pretendem, os resultados desejados e a probabilidade de, com isso, obter algum benefício para os agricultores de produtos vantajosos para a contabilidade nacional, quer para consumo interno quer para exportação.

Como disse no início, é imprescindível quando se inicia uma actividade, procurar os riscos inerentes a cada mini-sector com que vamos deparar, aprender a viver com eles e, a cada momento, procurar reduzir os incómodos surgidos. O risco de granizo é um fenómeno natural fora da limitação pela capacidade humana. Mas felizmente raramente assume dimensão de alta perigosidade. Assisti a uma tempestade que se desenrolou numa faixa de largura de pouco mais de 100 metros mas que, em alguns quilómetros, destruiu quase toda a vegetação que ali havia. Porém, algum tempo depois, a vida estava a continuar, depois de alguns pequenos ferimentos terem sarado e de terem sido reciclados os restos de árvores e outros vegetais destruídos. ■

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