Os políticos parecem preocupados com a possível manifestação dos militares na rua, no que estão apoiados por generais que, normalmente, ou não se pronunciam ou se comportam como porta-vozes do poder. Hoje, para serem generais é indispensável a aprovação e confirmação do Governo, o que exige deles uma atitude adequada quer antes da promoção, para a obter, quer depois como acto de gratidão. Escrevo isto recordando a atitude do Almirante CEMGFA quando de umas manifestações num ano recente, veio à TV papaguear as palavras ouvidas pouco antes ao ministro Luís Amado, sem ter uma palavra de compreensão e conforto para os militares que era suposto representar e defender. Ficou bem claro que lhe era mais conveniente representar e defender o ministro. Um dos argumentos utilizados na altura para condenar a manifestação era o de que os militares estavam sujeitos à «condição militar».
Esta condição, por um lado, impõe restrições aos direitos, liberdades e garantias que tornam os militares cidadãos de segunda, com muitas limitações e muitos deveres entre os quais o de disponibilidade permanente, que criam dificuldades aos próprios e aos seus familiares. Por outro lado, ao longo do tempo, os governos de um País que se preza de ter abolido a escravatura, há muitos anos, decidiram compensar os servidores da Pátria nas Forças Armadas por forma a que os sacrifícios a que por aquela condição estão sujeitos pudessem ser suportados sem demasiado desconforto. Estas compensações têm sido retiradas com a alegação de que são privilégios e regalias diferentes dos funcionários públicos, como se qualquer funcionário esteja sujeito a algo parecido com a referida condição militar.
Segundo esta, os militares não podem ter sindicato, atendendo que os seus chefes os defendem melhor do que qualquer sindicato!, o que ficou atrás referido como irreal, virtual, falso. Por isso, a lógica conduz a que a condição militar seja considerada inexistente, visto que a parte compensatória foi unilateralmente eliminada, e que os militares possam manifestar-se, exigir o pagamento de horas extraordinárias, seguro de vida, negociação das condições de risco de cada missão, etc. Claro que um exército, à imagem da função pública não pode ser eficiente. Mas, então, recriem-se as condições para que o seja e deixem de se verificar as actuais tristes condições dos militares.
P.S.: Transcreve-se uma carta envida aos jornais sobre este tema
Militares ou escravos?
(Publicada no Diário de Notícias 15 de Agosto de 2005)
Nos jornais de hoje (11 de Agosto) vem em destaque que «Governo retira regalias a militares». Parece que os militares usufruíam de regalias não justificadas à semelhança dos políticos. Pretende-se colocá-los em condições semelhantes à função pública. Mas tal semelhança seria falsa, pois os militares não são funcionários públicos vulgares, tendo um estatuto de disponibilidade permanente, para qualquer missão quanto a risco ou a local geográfico. Por exemplo, em 10 de Agosto de 1959, mais de duzentos militares foram mobilizados para em 12 (dois dias depois) embarcarem para a Guiné, onde estiveram mais de dois anos, correndo riscos diversos, longe das famílias, sem direito a qualquer tipo de licença. Um deles deixou a mulher grávida e só veio a conhecer a filha, quase com dois anos, no momento do desembarque.
Serviço de escala de 24 horas seguido da formatura para a instrução do dia seguinte; instrução nocturna; exercícios de fogos reais e outras situações de risco; marcha para outra unidade ou centro de instrução sem aviso prévio, etc; restrições aos direitos de cidadania. Tudo isto era, de certo modo, compensado pelas agora denominadas «regalias».
É previsível que agora, com uma geração de militares mais esclarecida e aberta ao ambiente circundante, não queiram ser tidos como escravos gratuitos e, por isso, não assinem qualquer contrato sem primeiro verem a sua adequação à legislação da função pública, pedindo parecer aos respectivos sindicatos, e sem analisarem as compensações concretas e claramente definidas dos esforços que não se integrem na função pública geral. Depois de entrarem em funções, terem como referência mais a legislação da função pública do que a militar e recusarem prolongamentos do horário, serviço extraordinário, missões de risco, mudanças de local de trabalho, sem previamente negociarem as adequadas compensações. Se o Governo quer considerá-los semelhantes aos funcionários públicos, não deve exigir-lhes riscos que estes não correm: serviço na carreira de tiro, exercícios de fogos reais, actividade física com perigo de acidente, trabalho nocturno, etc. Para cada serviço deste género deve haver uma compensação adequada. Por outro lado, há que reivindicar «regalias» semelhantes às dos juizes, professores, incluindo direito à greve, e, porque não, semelhantes às dos deputados, gestores e directores de institutos e empresas públicos.
Os militares responderão a estas palavras, dizendo que, dessa forma, as unidades ficarão inoperacionais e os comandantes não poderão cumprir a missão que receberam. Sem dúvida. Devem, por isso, evitar chegar a essa situação, esclarecendo, desde já, os políticos de que os militares não podem ser reduzidos a funcionários públicos e não podem ser considerados escravos gratuitos. A disponibilidade permanente para qualquer missão em defesa dos altos ideais patrióticos tem forçosamente de ser compensada. Não se querem «regalias»; quer-se a justa compreensão do seu sacrifício e condições compensatórias dignificantes.
A. João Soares
A Decisão do TEDH (397)
Há 45 minutos
1 comentário:
Agora vieram dizer que os militares têm direitos adquiridos aos 20 anos de serviço...isso já era assim antes destas polémicas reconversões...pois que passou à reserva até 31DEZ05 tem direito à reforma por inteiro!...
Falta as polícias........
Abraço
MR
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