sábado, 23 de dezembro de 2006

25 DE NOVEMBRO NA 1ª PESSOA

O texto que se segue, apesar de não conhecer o seu autor, foi-me enviado por um amigo merecedor de total confiança, com a sugestão de inserir aqui.

Falo nu e cru e sem olhar a determinados considerandos que são importantes para alguns e que vão distorcendo a realidade dos factos e criando mitos.

No 25 de Novembro de 1975 era Alferes Milº Infª CMD, comandante do 2º GC da CCmds 113/75. Cada comandante de grupo tinha duas chaimites distribuídas com o seu pessoal. Quando da organização da força para tomar a unidade insubordinada, a minha primeira chaimite ficou com o Cor Jaime Neves, Comandante do Regimento de Comandos e eu passei para a minha segunda chaimite.

Nesse dia, 25 de Novembro, subimos a Calçada da Ajuda, para tomar o Regimento de Lanceiros de Lisboa (RLL), unidade por excelência da Polícia Militar, apesar de aqui não haver a tradicional fricção de Comandos e PM. O que se passou foi que o Comandante e 2º Comandante dessa Unidade não acataram a ordem do Presidente da Republica (General Costa Gomes) para se apresentarem no Palácio de Belém, numa altura em que fora declarado o estado de sítio. Nessa acção subimos pela manhã a Calçada de Ajuda com as chaimites, salvo alguns elementos, entre eles o Comandante de Companhia, Cap Artª CMD Apolinário que avançara para garantir a passagem da coluna. Quando a minha chaimite chegou ao cruzamento definido pelo entroncamento da rua de Cavalaria 7 com a entrada do portão do RLL (que hoje se encontra modificada e deslocada) sentimos os disparos duma metralhadora pesada postada numa janela do 1º andar do edifício da Cavalaria 7. Esse fogo foi cruzado com o de outra metralahadora pesada instalada na parte traseira dum Unimog 414 e no enfiamento do portão de entrada para a parada do RLL. Esta metralhadora era manuseada por um Aspirante do Regimento de Infantaria Operacional de Queluz (RIOQ), a única baixa dos insurrectos.

Como havia uma vala aberta na estrada - Calçada da Ajuda - a primeira chaimite minha (onde vinha o Cor Jaime Neves - parou e a segunda viu-se obrigada a parar, tendo ficado defronte do portão do RLL e servido de alvo à metralhadora pesada 12,7 mm (aquela que o Fitipaldi usava na sua chaimite, quando ia tomar café). Saímos de gatas pela portinhola lateral e oposta à porta do RLL. Dali e com uma equipa entrámos ela Direcção da Arma de Cavalaria (DAC), casa que ficava acima do RLL e fazia esquina com a rua entre o RLL e o Depósito Geral de Adidos (DGA, hoje Centro de Classificação e Selecção de Lisboa - CCSL -).

No interior das instalações da DAC foi preso um indivíduo civil, que possuía três identificações militares, uma de cada Ramo das Forças Armadas, e era afecto ao Partido Comunista Português. Mais tarde poderei contar a história deste indivíduo quando dos funerais na Basílica da Estrela.

Já no interior das instalações e nas janelas que davam para a parada do RLL, estávamos cinco oficiais, alguém chamou a atenção ao Aspirante (estava com a farda n.º 3 e em cima do Unimog) para acabar com os disparos. Havia um militar com ele que saltou da viatura e desapareceu. O dito Aspirante reagiu virando o cano da arma na nossa direcção. Ouviu-se um tiro e ele tombou com um tiro na cabeça. Mais tarde vi esse militar na enfermaria do RLL.

Eu e a minha equipa de soldados (cada Cmdt GC era cumulativamente comandante da segunda equipa do seu grupo) demos uma volta pelas instalações do edifício principal (comando, repartições, alojamentos, bar, refeitório) acabando por chegar a um local que servia de prisão e onde se encontravam muitos civis (alguns dados como desaparecidos pelas suas famílias) e que foram sujeitos a sevícias por alguns militares do RLL. Também poderei falar sobre isso, mais tarde. Ao atravessar a parada e entrando num dos edifícios da frente dei com mais de uma centena de indivíduos lá dentro, (a maior parte era jovens recrutas com alguns dias de tropa). Corri a porta de ferro tipo hangar e fui dar a volta pelas restantes instalações.

Mais tarde houve uma grande formatura com todo o pessoal na parada e foi dito aos militares do RLL que iriam para casa e que a sua situação seria posteriormente regularizada.

Nesta acção do 25 de Novembro, interveio a minha Companhia (113/75, a que pertencia o falecido Fur CMD Pires) e a CCmds 112, comandada pelo Capitão CMD Lourenço, a que pertencia o falecido Ten Cav CMD Coimbra. Sobre estas mortes poderei escrever posteriormente. Não foram diferentes das que vi de alguns na guerra do Ultramar. Passem bem!!!

Sérgio Falcão

Os factos aqui relatados, embora eu não possa confirmar alguns pormenores, são do meu conhecimento, d uma forma geral, por os ter vivido de perto quando me encontrava no Palácio de Belém, no Gabinete do Presidente Francisco Costa Gomes, onde desempenhava funções de adjunto.
Não posso deixar de, mais uma vez, reconhecer o valor e a disciplina dos Comandos que , em cada momento, souberam conter o uso d força dentro do estritamente conveniente.

5 comentários:

Anónimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

AUDACES FORTUNA JUVAT

HATARI

MAMA SUMÉ

MAJOR JOÃO HUMBERTO DE CAMPOS CARVALHO - LUSO / BUÇACO

10.º COMPANHIA DE COMANDOS "COBRAS"

www.lusoprosecontras.blogspot.com

Anónimo disse...

A História do 25 de Novembro está ainda por fazer. Nesa altura eu estava colocado na EPC. Fazia parte de uma lista "B" (oficiais sobre quem se desconfiava politicamente — eu não era suficientemente "progressista") elaborada na sequência de uma "assembleia selvagem" liderada pelo Maj. Mário Tomé, que ocorreu após o 11 de Março...
Mas vivi por dentro os meandros do acontecimento.
Gostaria imenso de conversar consigo em particular sobre o assunto, do qual tenho uma opinião algo fora do comum.

Anónimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
A. João Soares disse...

Mário Relvas e deprofundis,

Não sei pormenores que me permitam uma discussão profícua sobre o 25 de Novembro, pois devido às funções que desempenhava, procurei manter-me afastado das preparações de ambos os lados. Recordo-me com certa graça de que os elementos do gabinete do PR, a que eu pertencia, me chamavam comunista e os da Casa Militar me chamavam fascista, simplesmente porque desempenhava um papel moderador e apaziguador entre uns e outros, tendo evitado cenas de violência que seriam pouco edificantes dentro de uma instituição que devia impor-se ao respeito do País.

Quem tiver comentários ao texto de Sérgio Falcão ou outros dados sobre aqueles acontecimentos pode inseri-los aqui, que serão levados ao seu conhecimento.

Feliz Consoada para todos os visitantes deste Blogue
A. João Soares