sábado, 29 de março de 2008

Proibido dizer «O rei vai nu»

O sr. coronel reformado da FAP, Luís Alves de Fraga, autor do blogue "Fio de Prumo", está submetido a processo disciplinar por criticar as «longas filas» de militares para marcar consulta no Hospital do ramo (ver DN).

Alves Fraga considerou que "As chefias responsáveis (...) já deviam ter tomado medidas contra tal estado de coisas", e questionou-se se "não serão os Serviços do Estado-Maior da Força Aérea competentes para estudarem e resolverem o problema da marcação das consultas do Hospital".

Segundo o advogado de defesa, a nota de culpa diz que «aquelas afirmações violam o Regulamento de Disciplina Militar (RDM) por ferirem a dignidade, a honra e o bom nome das chefias da FAP e, em particular, do seu chefe do Estado-Maior, serem atentatórias da coesão e disciplina na FAP e denotarem, ainda, falta de respeito por aqueles generais e pelos cargos que ocupam».

Segundo o mesmo, este processo é ofensivo dos mais elementares direitos constitucionais dos cidadãos e até do regime democrático". Como "o militar na reforma não se encontra sujeito às restrições constitucionais relativas à liberdade de expressão", o advogado garantiu ao DN estar-se perante "um problema de liberdade de expressão", onde o recurso ao RDM pela FAP visa "humilhar publicamente alguém que pela sua verticalidade, coragem e saber merece a consideração de todos".

Desde muito novo, que conheço um aforismo, segundo o qual, «o comandante é responsável por tudo o que na sua unidade se faz ou deixa de fazer». Por isso, as autoridades que superintendem nos referidos serviços não podem alijar a responsabilidade pelo que de menos bom neles ocorra. E, num funcionamento normal, elas sabem – ou pelo menos devem saber - o que se passa, e devem tomar medidas para corrigir o que exigir correcção. Como as deficiências são reais, é lógica a dúvida se existe competência para serem estudadas e resolvidas, pois podem ser de tal modo complexas que ainda não tenha sido possível resolvê-las com os meios existentes.

É estranha a actuação da autoridade ao invés da moral da história que nos relata o elogio ao miúdo que teve a sinceridade de dizer «o Rei vai nu». A posição do sr. coronel foi a de alertar para uma situação que causa desconforto a utentes do hospital em posição de debilidade e de sofrimento. Mas num visível mau uso da autoridade, em vez de exercer o esforço no sentido de eliminar rapidamente a deficiência relatada, procura calar o mensageiro. Isto não é próprio de uma democracia.

Parece que aquilo de que o processo acusa o mensageiro, é uma «falta» de que devem ser acusados os responsáveis pelos serviços até ao mais alto escalão. Com efeito, a existência das deficiências referidas fere a dignidade, a honra e o bom nome das chefias da FAP (e de todos os militares do ramo) e, em particular, do seu chefe do Estado-Maior, e é atentatória da coesão e disciplina na FAP e afecta o respeito que deve ser merecido pelos generais e pelos cargos que ocupam.

Será desejável que tais deficiências e outras do género sejam corrigidas logo que detectadas, para a coesão de todos os militares e para a dignidade, a honra e o bom nome destes e das chefias. Portugal precisa de Forças Armadas prestigiadas e de um espírito positivo e colaborante dos seus elementos, do seu capital humano, a todos os níveis.

Ao sr. coronel Alves de Fraga, desejamos que não seja molestado nas suas qualidades, publicamente reconhecidas, de verticalidade, coragem e saber, de que deu provas, mais uma vez ao denunciar, as deficiências referidas.

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