É opinião generalizada que o mundo está cada dia mais violento e sujeito à eclosão de conflitos. Talvez essa sensação seja adquirida por influência da pequena criminalidade local ou devido a leituras apressadas e pouco esclarecidas das notícias.
Com efeito, uma análise mais cuidadosa e desapaixonada permite obter conclusão diferente. Apesar de conflitos de média intensidade como o da Geórgia, são raras as situações violentas entre Estados, embora o poder pacificador da ONU esteja muito reduzido. Quando as relações entre Estados começam a aquecer, surgem as potências mais influentes a propor o diálogo e a oferecerem-se para negociadores e moderadores, principalmente quando se trata de regiões com interesses geoestratégicos dessas potências, quer pela posição geográfica quer pelos recursos naturais.
Foi desta forma que se resolveu a questão da Coreia do Norte que acabou por suspender a ameaça de arma nuclear que preocupava os países vizinhos e o da outra margem do Pacífico.
Também o Presidente Muamar Kadhafi deixou de integrar o «eixo do mal» para passar a ser um bom amigo de muitos Países do Ocidente, em que Portugal se inclui. O início da viragem partiu de conversações da Grã-Bretanha e França com a Líbia, antes de desencadeada a intervenção no Iraque, e o fortalecimento das relações deveu-se principalmente ao fornecimento de petróleo, quando esta fonte de energia teve grande alta de preços sustentada por muitos meses.
Quanto ao Zimbabwe, o problema interno da fome e da desejada substituição de Robert Mugabe, que se revestiu de hostilidade verbal a países vizinhos e europeus parece estar próximo de uma solução negociada e sustentável com um governo contando com nomes da oposição. A solução deveu-se a pressões de chefes de Estado, nomeadamente o da República da África do Sul. A União Africana já tinha intervindo nos casos do Sudão (Darfur) e no Quénia, o que evidencia a importância do tema deste post.
O Sara Ocidental, embora não esteja definitivamente resolvido, tem evoluído de forma pacífica, evitando a continuação da guerrilha de há mais de duas décadas. No entanto continua por realizar o referendo popular no Sarah, prometido pela ONU há mais de duas décadas.
A independência do Kosovo, embora sem colher o voto favorável de todos os sujeitos de direito internacional, está praticamente arrumado, sem a ameaça de repetição do conflito de há pouco mais de uma década.
O próprio Irão que se mostrou tão irredutível quanto à energia nuclear, já aceita solução negociada para a resolução do diferendo.
Agora, o conflito da Geórgia por causa da Ossétia do Sul e da Abkásia está em situação de cessar-fogo, com boas perspectivas de entendimento definitivo.
A Caxemira onde ainda não se efectuou o referendo prometido pela ONU em 1948, depois da primeira guerra por sua causa entre a índia e o Paquistão, e que depois originou outro conflito em 1965, tendo, a partir daí, sido palco de pequenos conflitos que raramente preocuparam demasiado os países vizinhos. Vale a pena recordar que quando foi dada a independência à Índia inglesa foram, por motivos de religião, criados dois estados, a Índia e o Paquistão. No entanto a Caxemira, onde a maioria da população é muçulmana e que, por isso, devia ter sido integrada no Paquistão ficou submetida à autoridade hindu, por o seu Administrador ter essa religião, o que originou o mal estar posterior. No conflito mais recente, em que os dois vizinhos, ambos com capacidade nuclear, deslocaram os seus lança-mísseis para perto da fronteira, houve sérias preocupações de resultados demasiado funestos. Mas as intervenções oportunas e eficientes de estadistas mundiais conseguiram acalmar os ânimos, evitando que fosse ultrapassado o ponto de não retorno.
Notícias muito recentes anunciam o restabelecimento de relações diplomáticas entre a Síria e o Líbano, com o respeito mútuo pelas respectivas soberanias, pondo fim a uma espécie de ocupação colonialista da «Sintra do Médio Oriente» pela sua vizinha Síria.
Embora informalmente, existem na comunidade internacional dos nossos dias caminhos para restabelecer e manter uma paz sustentável, no que se refere aos conflitos mais perigosos. Há nas grandes potências predisposição para pequenas cedências de parte a parte a fim de evitarem um conflito do género II Guerra Mundial que, com as actuais armas de destruição massiva, significaria o fim da humanidade.
Porém, no Sri-Lanka (antigo Ceilão e Taprobana) a guerra interna com os independentistas Tamil, embora tenha tido varia tréguas de curta duração, ainda continua, devido à teimosia irredutível da Sra Chandrika Bandaranaike Kumaratunga, filha de um dos autores da independência, Solomon Bandaranaike, assassinado em Setembro de 1959. Mas, embora frequentemente ocorram numerosas baixas não passa de um problema interno sem colocar e risco a paz mundial.
Sobre este tema, abordado com uma perspectiva diferente, pode ler-se o post «Precisam-se novas praticas» e «Os amigos são para as ocasiões» no blog de AP, em que refere de modo curioso o conflito entre a Rússia e a Geórgia, devido à Ossétia do Sul. Também podem ser consultados inúmeros posts aqui publicados sobre a vantagem de os desaguisados internacionais serem resolvidos pela via pacífica, da negociação, em vez de acções bélicas. As forças militares bem poderiam ser mantidas apenas para obter efeitos de dissuasão (evitando conflitos) e para retaliação (no caso de algum Estado incauto pisar o risco).
Links para posts referidos ao tema:
- Caxemira, um caso pendente
- Negociar, coligar em vez de utilizar as armas
- Sara Ocidental, Polisário
- A Paz pelas conversações
- Guerra a pior forma de resolver conflitos
- Paz pela negociação
- A Paz como valor supremo
- Guerra de civilizações ou guerra de tradições?
quinta-feira, 14 de agosto de 2008
Relações internacionais mais pacíficas?
Posted by A. João Soares at 17:38
Labels: conversações, cooperação, negociação, paz
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2 comentários:
Neste mundo louco, quem acredita na pacificação
Saudações amigas
Caro Valente,
Compreendo a sua descrença. Mas se o mundo a nível social anda muito instável, o mesmo não acontece a nível inter-estatal. As relações entre Estados bem governados, desenvolvidos, com capacidade económica e militar, obedecem a uma lógica estável, coerente, com continuidade. Há linhas estratégicas que estão a ser seguidas desde há séculos, embora com pequenas oscilações em função das circunstâncias. Nas relações internacionais há poucos estados bacocos como o nosso que tem um povo pobbre e se dá ao luxo de perdoar as dívidas a estados com mais potencialidades e de gastar fortunas com Timor, onde ninguém parece entender-se e que desde 1975 têm desperdiçado oportunidades de viverem melhor.
Os Estados bem governados procuram defender os seus próprios interesses em qualquer actividade em que se metem.
Quanto a pacificação, ninguém acredita que ela aconteça a 100%. O que se deve esperar e, nisso, há sinais muito positivos, é que nos atritos entre Estados cada vez menos serão utilizadas as Forças Armadas em acções bélicas. As soluções mais utilizadas têm sido as conversações e negociações, através de intermediários, mediadores aceites pelas duas partes. Claro que atritos não podem deixar de haver, tal como continuarão dentro dos Estados entre os partidos. A unanimidade só é possível com ditaduras e, portanto, impossível nas relações internacionais. E os atritos e pequenos conflitos evitam o marasmo, o pântano putrefacto, e originam progressos de vária ordem.
Por isso, caro C. Valente, eu acredito que as guerras como as duas grandes do século passado serão coisa apenas da história. Oxalá esta previsão venha a ser realidade!
Abraço
João
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