Como os leitores têm observado, nesta época complicada de campanha eleitoral tenho reduzido os textos relativos à observação da vida social e política nacional, a fim de evitar trair o meu propósito de independência apartidária e não beneficiar nem prejudicar qualquer dos partidos que se digladiam na arena da caça ao voto.
Mas não resisto a hoje transcrever dois pequenos textos que considero muito elucidativos daquilo que está a passar-se.
A. O primeiro é a parte final do artigo de opinião de Rafael Barbosa, «Tenham medo, muito medo» no JN:
«4 - Conclusão: os partidos portugueses, dos mais pequenos aos maiores, passando pelos intermédios, decidiram que é através da desqualificação do outro e não pela afirmação da capacidade própria que se conquista um voto. Imaginam as luminárias que elaboram as mensagens que somos crianças inocentes, sempre cheios de medo do bicho-papão.»
B. O segundo é o artigo de opinião de Manuel António Pina, «O perigo das palavras» também no JN:
«Como o outro diz, há palavras que nos beijam. Ok, mas também há as que atropelam e fogem. As palavras não merecem confiança, há adjectivos que, às esquinas das frases, atacam honestos substantivos de regresso do trabalho diminuindo-os e enxovalhando-os, verbos que, em vez fazerem o discurso progredir, lhe travam o caminho e comprometem o sentido, advérbios preguiçosos, preposições despropositadas, sei lá que mais.
E, depois, há as apenas inconvenientes e mal formadas que, uma vez pronunciadas, se nos agarram como uma pastilha elástica pisada e podem dar cabo de uma reputação, como o "hádem" de Jorge Coelho ou os "houveram" da ministra Lurdes Rodrigues.
Agora que as palavras andam por aí à solta, nos debates, nos comícios, nas declarações inflamadas, é bom que os políticos se cuidem. Sócrates, por exemplo, deveria estar de olho naquele "avançar", do slogan "Avançar Portugal", que pode muito bem significar "passar por cima de", e Ferreira Leite faria bem em desconfiar do substantivo "Verdade", que é dado a engasgar quem o usa e depois, sobretudo quando escrito com maiúscula, é difícil de engolir.»
E nenhum refere a referência à ética que nada tem a ver com a política, nem vice-versa, segundo Paulo Rangel, confesso admirador de Nicolau Maquiavel (1469-1527).
A Decisão do TEDH (396)
Há 22 minutos
2 comentários:
Caro João Soares
Sou um grande admirador de Nicolau Maquiavel. Não como seguidor das suas teorias mas sim pelo realismo e desassombro que revela. Quer queiramos quer não, a política é a arte de conquistar e manter o poder e não a arte de governar. Está mal, mas foi, é e será sempre assim. Maquiavel é intemporal.
Ao cidadão comum compete compreender as suas teorias para se poder defender dos seus malefícios. É preciso perceber, de uma vez por todas, que os políticos querem o poder para o usar em proveito próprio. Pensar que há gente que coloca o interesse colectivo acima do próprio, é suicida.
É preciso desmantelar as máquinas do poder. No mínimo, reduzir a sua dimensão am mínimo indispensável.
Aqui em Portugal está-se a cometer o erro tremendo de tudo se politizar: o funcionalismo público, a Justiça, o Ensino, a Segurança Pública, a Comunicação Social, a Saúde, as Forças Armadas. E é por isso que o país está ingovernável. Porque não existem já nenhuns mecanismos independentes que não sofram com as frequentes mudanças de quem conquista o poleiro.
A política é um mal necessário. Por isso, é nossa obrigação reduzi-la à sua expressão mais simples.
Resumindo: há que não votar nos partidos. A bon entendeur...
Caro Vouga,
Só não me confesso espantado, porque já conheço a sua clarividência e o seu realismo brilhante. Como observador independente, sou optimista e bastante utópico, como defensor da ética e outros valores essenciais, mas não nego que a realidade é a porcaria a que assistimos e cuja mecânica assente na ambição de poder e mais poder, o amigo define muito bem.
A solução que propõe é difícil e «utópica», porque para despolitizar a máquina do Estado, deixar de haver nomeações políticas e passar a haver preenchimento de vagas por concurso público, é preciso que os detentores do poder permitam e isso só acontecerá sob uma pressão revolucionária. Não largam a presa senão quando virem as armas apontadas ao umbigo.
A sua sugestão, para já, é o povo não lhes dar a procuração de plenos poderes, o voto, que ele querem. A melhor solução é ninguém se abster e ir às urnas meter o papel em branco.
Um abraço
João Soares
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