sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Monólogo de idoso

Tive um dia difícil muito propício à meditação. Esta manhã, quando ia de comboio para o almoço das Sextas estive parado na linha do comboio quase uma hora devido a um individuo que se suicidou sob os rodados de uma composição que iria duas ou três à frente da minha.

O Homem (ou mulher) foi egoísta até ao último momento, pois haveria muitas formas de por termo à vida sem prejudicar milhares de pessoas que eram transportadas nas composições que foram paradas na linha. Por outro lado, pensamos nos pensamentos trágicos que minaram aquele cérebro nos últimos tempos de vida. Quantas dificuldades insolúveis para aquela criatura.

Parecidas com estas reflexões vieram outras. Quando regressava do almoço, que decorreu perto do largo da Severa acima da Rua do Capelão, ao percorrer a pé a Rua João das Regras que desemboca na Praça da Figueira, estava uma jovem entre outras, mais ou menos graciosa e um idoso (com aspecto de ser mais «experiente» (ou «velho» ou idoso do que eu) a dizer: «a menina: é bonita, aliás na sua idade são todas bonitas».

Sem abrandar o passo que me ia levar ao Cais do Sodré para tomar o comboio, olhei rapidamente para trás e vi umas coxas semi-cobertas por uma mini-saia generosa e umas meias de malha larga e transparente , não chegando ao meio da coxa.

Imaginei o monólogo do idoso (experiente ou velho).

- Ela é mesmo atraente, mas se for com ela arrisco-me a apanhar a sida.

- Mas que me importa, tenho de morrer, se não for de sida, será de outra coisa que até pode ser pior e, ao menos, desta forma, terei momentos de grande prazer. (Ao imaginar este diálogo, pensei no suicida do comboio).

- Mas eu tinha decidido que havia de morrer saudável, sem uma doença prolongada, não fumo, não bebo em exagero, tenha cuidado com a comida.

- Mas tenho de decidir. Esta hipótese de morrer saudável não está garantida, enquanto os minutos de prazer que esta menina me pode dar, ninguém mos tira depois…

À laia de telenovela interrompida, deixo aos leitores o drama que se poderá seguir na mente ou mesmo no corpo deste idoso. E não esqueçam os dramas que devem ter afligido o suicida dos carris.

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