Transcrição de artigos seguidos de outros pontos de reflexão:
Saber sem poder saber
Jornal de Notícias. 08-08-2010. Por António Freitas Cruz
«Já transitou para o baú das velharias, embora com pergaminhos de ciência política, uma frase que dá muito jeito em certas circunstâncias: "em política, o que parece é". Não há grande discussão sobre o facto de esta brilhante pérola se dever a Salazar. O que sei é que ele a usou naquelas pesadas e solenes orações da Assembleia Nacional, durante as quais exibia o seu nunca negado estilo linguístico.
Circulava por aí às voltas com pensamentos depressivos quando me perguntei acerca das razões por que nós, portugueses de hoje, andamos desorientados, sem pé e sem fé, falidos até de auto-estima, tolhidos por uma descrença que se não mede em euros, nem se resolveu com os pontapés do Cristiano Ronaldo (ao contrário do que prometiam obsessivamente as queridas televisões…).
Foi por esses dias que vi nos jornais o inusitado alívio do nosso procurador-geral por ter conseguido garantir que ninguém (nem a História!) acederia às célebres escutas que apanharam José Sócrates. Depois disso, aconteceu tudo o que fomos conhecendo também sobre o famigerado caso do Freeport, que acabou por correr muito mal aos mais altos e abnegados zeladores da Justiça.
Então, deu-me para exorbitar da chinela, dar voz ao meu momento criativo, e pensar que poderíamos dizer: "na Justiça, o que sabemos… não podemos saber".
Eis uma frase com futuro: talvez vá parar aos compêndios…»
A Justiça e a falta de tempo
Jornal de Notícias. 08-08-2010. Por Zita Seabra
«A Justiça portuguesa chegou a um ponto de tal gravidade que coloca em questão o normal funcionamento das instituições. O normal funcionamento das instituições não pode excluir o normal funcionamento da Justiça e limitar-se ao Governo e ao Parlamento. O Estado de Direito só funciona se a Justiça funcionar, se os cidadãos confiarem na Justiça e se a Justiça for célere e independente.
Tudo isto é tão evidente e óbvio que parece uma banalidade escrevê-lo. Mas o que estamos a assistir neste momento, em que o descrédito da Justiça entra pelos olhos dentro, é perigoso e de consequências graves previsíveis. (…)
Confesso, e já aqui o escrevi, que a divulgação de escutas de conversas privadas ao telefone são na minha opinião intoleráveis num Estado democrático. As pessoas, todas, incluindo o primeiro-ministro, têm o direito constitucional ao seu bom nome. Sendo agora o governo do PS ou no futuro do PSD, é necessário assegurar que os fins não justificam (nunca) os meios em política.
No caso Freeport, sabemos apenas que uma suspeita ficou deliberadamente no ar num processo que devia ser decidido ao fim de sete anos de investigações, de suspeitas, de notícias a encher manchetes. Poder-se-á chamar a isto justiça? Imaginemos que alguém que vai fazer um doutoramento chega ao júri e, ao fim de oito anos de investigação, escreve a tese e deixa no fim duas páginas de perguntas que, por acaso, são o essencial. Que acontecia? No caso Freeport é, porém, mais grave que um chumbo no doutoramento porque está em causa o bom-nome de pessoas.
O que assistimos é tão-só a uma intolerável politização da Justiça pela mão do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público e de alguns magistrados que, provavelmente, um dia sonharam ser políticos mas erraram na carreira profissional. (…)
O normal funcionamento das instituições impõe que os partidos responsáveis e garantes da democracia, bem como os outros órgãos de soberania, presidente da República incluído, encontrem saídas que travem este perigoso caminho e assegurem a salvaguarda do Estado democrático português.
É uma responsabilidade cívica de quem está na Oposição, como é o meu caso - e desejando que o país encontre uma alternativa de governo para sair da grave situação que hoje vive -, considerar inaceitável o que se passou com o primeiro-ministro, quando uns senhores escrevem, em nome da Justiça, um despacho que encerra um processo que afinal o deixa aberto, deixando no ar suspeitas e dúvidas a partir de um trabalho que não fizeram… por falta de tempo.»
NOTA: Em relação á conclusão de Freitas Cruz pode dizer-se que há muitos responsáveis por serviços fundamentais, onde o que sabem só interessa se for de origem burocrática, «oficial». Assumem-se como oficialmente ignorantes!
Sobre este tema será interessante passar os olhos por:
- Justiça igual para todos é necessária
- Serviços públicos pouco ágeis e eficazes
- Estado ignora número de clínicas sem licença
- "Não há registo da I-QMed na Entidade Reguladora"
- Entidade reguladora detecta 300 clínicas ilegais
- Ordem com queixas contra médico há cinco anos
Imagem da Net.
O «inconseguimento» de Montenegro
Há 1 hora
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