terça-feira, 30 de outubro de 2007

A matemática, amada e odiada

Existe uma difícil convivência entre os estudantes portugueses e a matemática. Mas, incompreensível contradição, os números são adorados por jornalistas, economistas, gestores e políticos. Citar uma estatística dá-lhes um prazer celestial, embora muitas vezes o façam de forma sinistra e tendenciosa.

Porém, os números acabam por desmascarar as baixíssimas médias nos exames escolares e enfatizar as péssimas classificações nas comparações internacionais. Para corrigir tal realidade, os dirigentes usam de sagacidade saloia e, a fim de reduzir o número do insucesso, usam a habilidade «milagrosa» de fazer exames mais fáceis. É um autêntico ovo de Colombo pois, em vez da catástrofe real, o resultado passa a ser uma maravilha, permitindo o acesso ao ensino superior, preenchendo todas as vagas dos cursos das áreas tecnológicas, que exigiam positiva a matemática. Mas disto resulta uma cadeia de efeitos inerentes citados por Alberto Castro no JN.

O resultados melhoram visivelmente, mas sem corresponderem a melhoria da preparação. Por este caminho, poderemos passar a ter uma sociedade de grande percentagem de diplomados, que não passam, na maioria dos casos, de analfabetos camuflados. Dizia um observador que, antes, um aluno iniciava o ano chumbado e tinha que se esforçar para passar, agora inicia o ano passado e o professor tem de se esforçar para o chumbar. Com tais critérios, parece que basta nascer para chegar a doutor e, mesmo que não queira ir tão longe, terá dificuldade, porque nem deixando de estudar, nem deixando de ir às aulas, o ajudam a desistir desse imperativo que lhe é imposto.

8 comentários:

Amaral disse...

João
Nem só a Matemática como o Português ou outra disciplina qualquer poderá ter sucesso, se os alunos não tiverem interesse em estudar. Se o sistema não obrigar os alunos a estudar nada se consegue, venham as pedagogias que vierem.
Abraço

A. João Soares disse...

Caro Amigo Amaral,
Concordo consigo. Os alunos devem ser estimulados a estudar, mas, pelo que me dizem, os psicólogos defendem que não se devem forçar as crianças porque isso as traumatiza e impede que cresçam naturalmente. Mas, com a falta de valores, do culto pela excelência, do prestígio do saber, da meritocracia, teremos um futuro de ignorantes que só pensam na ostentação de riqueza adquirida de qualquer forma. Exceptuam-se, certamente, uns poucos, curiosamente, de famílias onde ainda de respeita a ética a moral e outros valores tradicionalmente válidos. Depois serão alvos da inveja dos medíocres.
Um abraço

Jorge P. Guedes disse...

Eu iria dizer o que acabei de ler na sua resposta acima.

Sendo assim, poupou-me as palavras.

Caminhamos para uma geração de doutores do nada.
Os miúdos não são obrigados a estudar, a memorizar, a raciocinar, enfim a usar a cabeça.
Resultados ? Alguns até já andam por aí e por lugares de chefia. Outros virão. Cada vez em estado mais calamitoso!

E mais: talvez não saiba ainda o que vem por aí.
Agora, alunos que tenham reprovado por faltas injustificadas serão, no final do ano, submetidos a um exame especial para eles. E esta? Que tal? Sobre que matéria será feito o tal exame? Daria para rir se não fosse patético!

Um abraço.

A. João Soares disse...

Caro J. G.
Há um fenómeno muito humano que consiste na rejeição do vizinho quando se vê nele algo de superior, como inteligência, saber, etc. É a inveja a funcionar, seguida da calúnia, da maledicência, da rasteira, do embuste. Estamos a caminhar para uma sociedade desqualificada que acabará por nem servir para escravos dos países normais.
Mas aumenta a área de recrutamento dos políticos, isto é, dos assessores que saem de entre os estudantes falhados, com ligações aos da oligarquia, que depois sobem na carreira chegando até aos cumes da governação, sem nunca terem feito nada de útil na vida.
Um abraço

Anónimo disse...

Caro João Soares,

o fenómeno de rejeição do vizinho parece só funcionar no interior do país, pois os nossos jovens "estudam" e depois partem lá para fora, onde tudo fazem, mas cá...tá quieto que coisa fina é outra loiça!

Abraço

A. João Soares disse...

Essa separação entre interior e litoral é muito mais complexa do que isso. O culto da mediocridade está generalizado. O ensino está a funcionar para as estatísticas e estas são muito mais favoráveis se os professores forem mais benevolentes e generosos a dar notas. Tanto custa dar dez como 14 e a escola sobe no ranking!!!!
Abraço

Anónimo disse...

Caro João Soares, quando me referia ao interior do país queria dizer dentro do país, relacionando com a emigração dos doutores e engenheiros...

Abraço

A. João Soares disse...

Caro Relvas,
Isso é uma realidade de há muitos anos. Já o Eça, num texto que há poucos meses aqui publiquei, dizia que quem emigra são os mais válidos; os mais acomodados e menos capazes mantêm-se por cá; os piores de todos, que foram estudantes falhados e nunca conseguiram ter uma profissão, dedicam-se à política
As perspectivas de vida para um adolescente que não seja bom futebolista, podem ter duas alternativas: se forem bons estudantes, devem continuar a dedicar-se ao estudo, porque as oportunidades não faltarão, cá ou no estrangeiro; se forem maus estudantes sem habilidade para nada, devem inscrever-se na juventude de um partido dos grandes, participar nos comícios, nas campanhas eleitorais, ser afáveis para com os líderes, dizer a tudo «sim senhor», e, depressa, irão para assessores, depois, vereadores, ou deputados e por aí acima. O fundamental é não criar atritos dentro do partido, mostrar concordância com tudo. Acabarão com uma licenciatura fácil de obter e num «bruto tacho», com reformas variadas de milionário. Exemplos? Há vários. Há quem ande à cata deles no Diário da República, e os ponha a circular por e-mail.
Quanto a trabalhar em actividades necessárias ao desenvolvimento do País, teremos de importar imigrantes para o fazer. Há-os na construção civil e, o que espanta, até em bons lugares cómodos e bem pagos, admirando não haver portugueses que queiram ocupá-los, preferindo o desemprego.
Um abraço